segunda-feira, 15 de junho de 2009

Artigo de Marconi

Diário da Manhã

Opinião

15 de junho de 2009

Clinton, Goiás e o etanol

Marconi Perillo


Participei recentemente de um dos mais importantes encontros sobre biocombustíveis do mundo: o Ethanol Summit 2009, em São Paulo. Durante três dias, foram 150 palestrantes de todos os continentes. Entre os temas, sustentabilidade, novos investimentos e etanol de segunda geração.
O encontro foi organizado pela União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica). Tive a honra e satisfação de participar do evento ao lado do ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, com quem conversei longamente sobre diversos temas. Clinton comanda atualmente a Fundação Clinton, com projetos prioritários como o apoio ao crescimento sustentável da África e da América Latina. Também participaram o governador de São Paulo, José Serra, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf; Antonio Lambertucci, da Secretaria Geral da Presidência; Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo; o vice-presidente de países do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Roberto Veluttini; e o sub-secretário de Agricultura dos Estados Unidos.
O convite para participar de tão destacado encontro longe de representar motivo de vaidade pessoal significa o reconhecimento da importância de Goiás no cenário mundial, principalmente no aspecto da produção do etanol.
Como representante do Senado Federal, destaquei em minha palestra a importância da produção de etanol sem desmatamento.
Falar para um público tão seleto, como este que se reuniu, em São Paulo, para o painel “Biocombustíveis Crescendo sem Desmatamento” claro que traz o risco de cair no lugar comum. Todos nós que acreditamos no etanol como fonte de energia alternativa sabemos que o potencial de crescimento do setor é de valor inestimável para a inserção do Brasil na economia mundial e pode ser feito sem o risco de desmatamento da flora nativa, sobretudo se forem traçadas políticas públicas claras e bem definidas para o setor.
A fronteira do etanol representa, portanto, uma fantástica possibilidade de parceria com outros países, em especial com nossos irmãos africanos, que detêm vastas extensões de terras agricultáveis e se encontram igualmente carentes de oportunidades para inserção no mercado internacional. Não seria exagero dizer que, juntos, o Brasil e os países africanos com o quais mantemos convênios de cooperação poderiam abastecer o mundo com biocombustíveis e alterar de forma expressiva a distribuição das riquezas num círculo virtuoso de eliminação da pobreza e da miséria.
É fundamental ressaltar que, no campo social, a exploração do etanol traz a possibilidade de formação de comunidades de pequenos e médios agricultores em torno das usinas, com a infraestrutura de serviços necessários ao desenvolvimento da comunidade, inclusive com escolas, hospitais e equipamentos públicos em geral.
Para um país como o nosso, que tem assistido o inchaço das grandes cidades e o consequente crescimento da violência e dos bolsões de pobreza, a implantação de projetos de usinas com caráter social pode criar um vetor de desenvolvimento para o interior com implicações positivas em relação à sobrecarga das grandes cidades, cada vez mais difíceis de serem administradas.
O etanol é uma alternativa não só aos combustíveis fósseis, mas, também, uma oportunidade ímpar para que diversas nações em desenvolvimento possam encontrar um caminho para participarem efetivamente da economia global.
O Brasil, nesse contexto precisa lutar de forma permanente para se manter na vanguarda da tecnologia de exploração e desenvolvimento dos biocombustíveis e se colocar à disposição de outras nações, no continente latino-americano ou fora deste, que desejem explorar o etanol. Se nós vislumbramos há trinta anos as possibilidades dessa alternativa, torna-se imperioso que, pelo esforço do Estado, da sociedade e dos setores produtivos, continuemos na liderança mundial.
A verdade clara é que o Brasil tem a capacidade de expandir o setor sucroalcooleiro para o fornecimento de etanol em larga escala, visando à substituição de 5% a 10% da demanda mundial de gasolina em 2025.
Sempre é oportuno observar que, considerando as políticas e legislação de 21 países, a demanda de etanol para 2010 já seria de 80 bilhões de litros por ano, embora seja necessário reavaliar esses números diante da crise mundial.
Importante salientar que o Protocolo de Quioto firmado em 1997, estabelece prioridade para a redução de emissões na atmosfera como forma de mitigar as mudanças climáticas e que os biocombustíveis são a alternativa mais viável para mover o mundo com menos poluição.
Brasil e Estados Unidos são os dois principais produtores e detêm, juntos, 75% da produção mundial. Porém, é preciso destacar que há diferenças importantes entre a produção norte-americana, baseada no milho, e a produção brasileira, baseada no álcool.
Em tese, o rendimento de etanol por tonelada de matéria-prima é favorável ao milho. Uma tonelada de milho produz 380 litros de etanol, ao passo que uma tonelada de cana produz apenas 70 litros do combustível.
Porém, na prática, a produtividade da cana é muito superior à do milho, tanto em termos de área cultivada quanto de impacto ambiental. No Brasil, um hectare de cana produz entre 60 e 120 toneladas, enquanto nos Estados Unidos um hectare de milho produz até dez toneladas do grão.
Em outras palavras, o pior cenário de produtividade de cana-de-açúcar no Brasil é mais favorável que o melhor cenário de milho nos Estados Unidos, uma vez que é possível extrair 4.200 litros de etanol a partir de um hectare de plantação de cana, ao passo que, para cada hectare de milho plantado, a extração correspondente é de 3.800 litros de álcool. Comparando o cenário mais favorável dos dois países, teremos 8.400 litros de etanol para cada hectare de cana contra 3.800 litros para a mesma área de milho, ou seja, nosso rendimento será 121% superior ao norte-americano.
Na qualidade de senador por Goiás e ex-governador desse valoroso Estado, ressalto o papel que nossa região oferece e o potencial que revela para investimentos em usinas sucroalcooleiras. Detemos diversas áreas com solos considerados ótimos ou bons para o cultivo da cana-de-açúcar.
Para que Goiás e o Centro-Oeste desempenhem o papel de destaque que lhes é devido nessa expansão da produção de combustíveis limpos do Brasil para o mundo, será necessário viabilizar as obras de infra-estrutura para o escoamento, os pontos coletores e os dutos até os portos do Centro-Sul.
O Brasil pode, portanto, desempenhar esta importante tarefa de tornar o movimento do mundo menos poluente sem risco de desmatamento ou colocação em risco de outras culturas alimentares. Para tanto, devemos traçar uma política para o setor, com diretrizes claras e bem definidas, sobretudo se o desejo for impulsionar a economia do País e deslanchar um círculo virtuoso de eliminação da miséria e da pobreza.
Marconi Perillo é senador e ex-governador de Goiás

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