terça-feira, 30 de novembro de 2010

Apagar das luzes





Política & Justiça

Contratos feitos no escuro
Titular da 4ª Vara Federal de Goiás, Luciana Gheller bloqueia liberação da primeira parcela do empréstimo milionário para Celg 

Titular da 4ª Vara Federal de Goiás, Luciana Gheller bloqueia liberação da primeira parcela do empréstimo milionário para Celg 

Juíza alega que governo descumpriu a resolução que regulamenta gastos nos últimos quatro meses de mandato e não levou em conta a capacidade de endividamento do Estado 

PGE recorre da sentença 

José Cácio Júnior

A juíza da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária de Goiás, Luciana Laurente Gheller, concedeu liminar protocolada pelo procurador da República do Ministério Público Federal (MPF), Cláudio Drewes, bloqueando a liberação da primeira parcela – no valor de R$ 1,2 bilhão – do empréstimo de R$ 3,728 bilhões para quitar as dívidas da Celg. De acordo com a decisão de Luciana, a Caixa Econômica Federal (CEF) – banco que irá liberar o valor – terá que depositar o montante em juízo.  

A juíza concedeu a liminar de forma parcial, pois não pediu o cancelamento do contrato existente entre o governo do Estado e CEF. Na decisão, Luciana se ampara basicamente em duas alegações para deferir a liminar pedida pelo MPF. Em primeiro lugar, a juíza explica que o Estado não  conseguiu aumentar o limite de endividamento ao negociar o Plano de Ajuste Fiscal (PAF) para os anos de 2010 a 2012. Em segundo lugar, a juíza sustenta que o empréstimo foi feito à revelia da resolução do 43/2001 do Senado, que proíbe que governantes do Executivo contraiam dívidas no último quadrimestre de seu mandato. 

Na liminar, o procurador Drewes ainda questionou se o empréstimo seria suficiente para quitar todas as dívidas da estatal, orçadas em aproximadamente R$ 7 bilhões. O procurador também questionou a legalidade dos débitos que a Celg possui e a forma como o valor será utilizado. “É um dinheiro muito grande para entrar a fundo perdido. A sociedade não tem notícias do valor (da dívida)”, completa Drewes. 

Segundo o procurador, a liminar também pede explicações em relação às dívidas da empresa. Conforme reportagem do Diário da Manhã do último dia 19, existem 70 ações do Ministério Público (MP) que investigam os contratos celebrados pela Celg. Drewes conta que as ações do MP investigam suspeita de superfaturamento dos contratos celebrados pela Celg, favorecimento a determinadas empresas e até a existência de licitações irregulares. 

O procurador também solicita que o Estado esclareça a forma como valor será utilizado para quitar as dívidas da Celg. “Não se sabe se o dinheiro irá para a Celg, a situação está um verdadeiro ping-pong. Dificilmente terá prestação de contas”, alerta Drewes. O procurador ainda disse que as negociações em torno do empréstimo foram realizadas de acordo com interesses políticos e não técnicos.  

Drewes explica que o relatório da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) permitindo o aumento do limite do endividamento do Estado não foi feito de forma “criteriosa” e nem “técnica”. “A análise foi feita de forma política para beneficiar o Estado”, completa o procurador federal. Drewes ainda disse que a liminar foi protocolada visando resguardar o patrimônio da União, afinal o governo federal tem a função de avalista do governo do Estado na negociação. “O valor do empréstimo pode vir a lesar os cofres da União.” 

O procurador ressaltou que a liminar não tem o objetivo de impedir que o empréstimo seja realizado, mas sim de responder às dúvidas acerca da operação. “Se o Estado cumprir todos os requisitos para contrair o empréstimo não tem o que questionar”, afirma Drewes, explicando que também pediu auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU) para fiscalizar o empréstimo. 

Drewes também teve acesso ao contrato assinado entre o governo do Estado e a CEF. Na opinião do procurador, o contrato é “vago” e “superficial”. “Não se sabe a origem das dívidas, não existe relatório apontado para onde vai o dinheiro.” O procurador ainda alerta para a possibilidade do governo utilizar o valor do empréstimo para não fechar o ano no vermelho. Ele lembra as declarações do secretário estadual da Fazenda, Célio Campos, que afirmou na semana passada que o governo pode fechar o ano no vermelho caso o empréstimo não seja liberado. “O Estado pode usar o dinheiro para não afrontar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e não ficar no vermelho”, completa o procurador. 


Procurador-geral prepara recurso contra liminar 

O governo irá recorrer da decisão da juíza Luciana Laurente Gheller, que suspendeu a liberação da primeira parcela do empréstimo para Celg. 

Anderson Máximo, procurador-geral do Estado, rebateu as justificativas da juíza de que o Estado não conseguiu aumentar o limite de endividamento e que o governador Alcides Rodrigues (PP) teria contraído o empréstimo fora do prazo legal em seu último ano de governo. A juíza se baseia na resolução 43/2001 do Senado que impede contratação de empréstimos por parte do Executivo no último quadrimestre do seu mandato, também amparada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Alcides assinou a contratação do empréstimo no dia 2 de setembro, prazo limite para finalizar operações financeiras dessa natureza. 

De acordo com o procurador-geral do Estado, o Ministério da Fazenda e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) já emitiram pareceres autorizando o aumento do endividamento do Estado. “A STN e o ministério da Fazenda autorizaram esse empréstimo dentro do PAF ( Plano de Ajuste Fiscal) 2010-2012. Então nós estamos trabalhando dentro de uma autorização do governo federal”, completa Anderson. 

Em relação à assinatura do contrato dentro do último quadrimestre da atual gestão, Anderson explica que o Estado possui documentos atestando que o empréstimo foi assinado dentro do prazo legal. O procurador-geral classificou como “nada jurídico” a decisão em que Luciana determina que a Caixa Econômica Federal (CEF) – banco de onde virá o recurso – deposite o valor da primeira parcela em juízo. “Tem o dinheiro, mas não pode ser usado”, diz Anderson. 

O procurador ainda lembrou os efeitos que o atraso na liberação do empréstimo podem causar. “Podem centrar na caducidade da concessão e federalização da Celg”, afirma. O valor da primeira parcela seria utilizado pela Celg para quitar dívidas com a Eletrobras e outras empresas do setor elétrico. Após a quitação desses débitos com o governo federal seria assinado o empréstimo-ponte de R$ 770 milhões para a Celg pagar o ICMS que deve ao Estado. O procurador também alertou para os prejuízos que o atraso na assinatura do empréstimo-ponte podem causar. O principal deles seria o aumento de R$ 250 milhões de encargos no valor do ICMS caso a Celg não pague a dívida esse ano, conforme anistia fiscal concedida pela Secretaria da Fazenda (Sefaz). 

Anderson acredita na “judicialização” dos prazos para o pagamento das dívidas do ICMS e da Eletrobras. Como a liminar impede que o dinheiro seja liberado, o procurador espera que o prazo para o pagamento das dívidas seja esticado caso o Estado consiga reverter a liminar. 


Vice-governador eleito volta a pedir informações sobre empresa 

O vice-governador eleito, José Eliton (DEM), coordenador-geral da transição administrativa, entregou documento na tarde de ontem ao coordenador-geral da equipe de transição do governo, o secretário da Fazenda, Célio Campos, pedindo esclarecimento de 14 itens sobre a realidade financeira e administrativa da Celg. O documento é semelhante ao que foi entregue na semana passada ao próprio Célio, pedindo as mesmas informações sobre a realidade do Estado. 

No documento entregue ontem, Eliton solicita: o valor que a empresa deve de ICMS ao Estado; cópia do Balanço Anual da Celg; relação do passivo judicial e extrajudicial da estatal; quantidade de funcionários da estatal e seus respectivos salários; relação das dívidas da empresa e as garantias que a Celg tenha oferecido para cobri-las; relação do patrimônio da estatal, com seu valor atualizado; créditos que a Celg tenha a receber e os cobra judicialmente; e créditos que a Celg possui com entidades públicas e particulares referentes à concessão de energia elétrica. 

O vice-governador eleito não quis se manifestar sobre a decisão da  juíza da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária de Goiás, Luciana Laurente Gheller, que suspendeu a liberação da primeira parcela do empréstimo para quitar as dívidas da Celg (leia mais acima). Para o ex-procurador-geral do Estado e integrante do grupo técnico da equipe de transição do governador eleito Marconi Perillo (PSDB), João Furtado Neto, a decisão da juíza federal “não foi impensada, pois ela a tomou após ouvir a União”. 

Para Furtado, a decisão de Luciana não irá prejudicar a Celg, pois a juíza determinou o depósito em juízo do valor da primeira parcela. Após o governo do Estado sanar as dúvidas do Ministério Público Federal (MPF) sobre a negociação, a operação pode ser retomada. “Não se quis dar transparência como se a operação fosse esconder algum fato que a sociedade ou o MPF não pudesse saber. Essa medida (a liminar) está longe de prejudicar a Celg ou o Estado. Ela torna o processo mais claro, mais transparente”, completa Furtado. 

Furtado acredita que a decisão da juíza federal pode “prejudicar interesses”, em referência à forma política como o empréstimo da Celg foi tratada. “O interesse do Estado, do nosso cidadão, da coletividade goiana está resguardado. Não há a menor possibilidade de que essa decisão leve à caducidade da concessão ou intervenção federal na empresa”, afirma.

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