segunda-feira, 8 de novembro de 2010

José Eliton: colaborar com Marconi Perillo!





Entrevista

José Eliton

“Quero contribuir com Marconi na construção de seu governo”
Vice do governador eleito afirma que não houve nenhuma conversa sobre ele assumir Secretaria de Segurança Pública

                                                    Fotos: Fernando Leite/Jornal Opção

Neófito em campanhas majoritárias, o advogado José Eliton Júnior (DEM) diz que gostou muito da experiência, que lhe possibilitou conhecer diversidades da população goiana ao buscar votos com Marconi Perillo (PSDB) por todo o território goiano. Ele fala da campanha, revela que o mais difícil foi combater o duro processo de desconstrução da imagem do tucano que os adversários imprimiram. “Os dois pontos fundamentais que eles trabalharam muito para a desconstrução da imagem de Marconi foram a criação do tal déficit nas contas do Estado, que tinha sido desmentido pelo TCE e pela Fipe, e a questão da Celg, que foi bem sensível” conta.

Segundo o vice, a melhor resposta que o governador eleito poderá dar será um governo de realizações. “Tenho conversado muito com o senador Marconi e sinto nele o objetivo muito forte de fazer um governo transformador, que marque a história de Goiás. O próximo governo marcará não apenas pelos investimentos no segmento social, como também pelos fortes investimentos na infraestrutura. Outro diferencial será na área de educação.”

José Eliton fala também de segurança pública, saúde e educação, entre outros temas. Especialista em direito eleitoral, ele faz críticas ao projeto da Ficha Limpa. E se afirma como um conservador, defendendo que a sociedade brasileira também é conservadora por pregar os valores da família. A entrevista foi concedida na quinta-feira, dia 4.


Cezar Santos — Sua indicação como vice de Marconi Perillo surpreendeu o mundo político goiano. O sr. também ficou surpreso?

Não. Estou filiado há muitos anos ao partido. Sempre participei das reuniões, das convenções e dos debates internos. Quando o [deputado federal] Ronaldo [Caiado] me convidou para ocupar este espaço, entendi que era o momento correto.


Euler de França Belém — O sr. pretende ser um vice mais participativo do que foi Alcides Rodrigues nos primeiros governos do Marconi?

Temos características absolutamente distintas e, com isso, não faço nenhum juízo de valor do atual governador Alcides Rodrigues, quando era vice. Eu tenho uma característica diferente. Eu gosto de participar mais. Gosto de dialogar. Entendo que é essencial o debate. Dentro de um partido existem visões diferentes, imagine em um governo composto por um amplo leque de forças políticas. Por isso, entendo que a discussão é absolutamente necessária e natural. Também entendo que a própria natureza do cargo de vice exige a discrição. Mas já disse em algumas oportunidades que a discrição não significa omissão. Pretendo contribuir com o senador Marconi Perillo na construção de seu governo, com ideias, com o pensamento do meu partido, com o meu pensamento.


Danin Júnior — Marconi foi muito atacado pelos adversários por um suposto desarranjo financeiro do Estado. Ele já soltou alguma coisa sobre o que vai fazer para dar uma resposta a essa ideia que os adversários dele plantaram, e conseguiram colher em grande medida, de que ele teria quebrado o Estado?

A expectativa dele é realizar um bom governo, um governo eficiente. Transformar em realidade as propostas que ele fez. Essa é a melhor resposta que ele tem a dar.


Danin Júnior - Especialmente sobre o assunto fiscal e o fluxo de caixa, ele tem dito algo?

Eu como advogado entendo que o Tribunal de Contas do Estado tem capacidade e corpo técnico qualificado e independência institucional para avaliar o caso. Se o TCE emitiu parecer informando que aquele déficit nunca existiu, se vem a Fipe, um órgão vinculado à Universidade de São Paulo e que tem tradição em Goiás, e diz a mesma coisa, com que mais elementos alguém vai desqualificar esses argumentos?


Danin Júnior — Certos atos são muito simbólicos e representativos. O sr. não acha que deve haver uma resposta à sociedade?

Não podemos ser calculistas. Uma coisa é discurso, é retórica, é a tentativa de imputar ao outro fato que não é verdade. Outra são os dados técnicos que nós temos. Eu penso que a melhor resposta que ele tem a dar é fazer um governo eficiente, que concretize as propostas dentro do governo e as apresente à sociedade.


Cezar Santos — Isso foi uma estratégia deliberada de marketing?

Nós sabemos que isso foi uma construção política, marketing de campanha. Tentaram desconstruir a imagem do Marconi.


Danin Júnior — Na campanha, que outro ataque dificultou a conquista de votos e que merece resposta?

As duas questões fundamentais que trabalharam muito para a desconstrução da imagem foram a criação desse déficit e a questão da Celg, que foi bem sensível. Lembro que no início da campanha eu estava caminhando na Avenida Castelo Branco e entrei numa loja que vende sementes. Conversando com as pessoas, uma disse que eu não iria votar no Marconi, porque essa pessoa tinha uma fábrica e havia três dias que faltava energia nessa fábrica. E ele dizia que era porque o Marconi tinha quebrado a Celg. Ora, é um negócio completamente absurdo. Tentaram construir esse discurso. Se você observar o balanço da Celg, ela chegou a ser lucrativa em alguns anos do governo Marconi. As dificuldades vêm desde Cachoeira Dourada. A questão da Celg foi tratada como política.


Euler de França Belém — E, agora, o dinheiro da Celg vem ou não vem?

Não sei. Foi o governador Alcides que fez esse contrato. Eu não tenho acesso ainda a esse contrato.


Euler de França Belém — Se o governador Alcides não viabilizou esse empréstimo em quatro anos, acredita que conseguirá em 50 dias?

Aí eu faço a seguinte pergunta: havia interesse dele em viabilizar? Agora, não adianta ficar olhando para o retrovisor. Se esse empréstimo realmente se consolidar, nós temos que trabalhar com essa realidade. Se não, dia 1º de janeiro temos que ter uma política de gestão para recuperação da Celg. Não tem outro caminho. Vamos encontrar o Estado de que forma? A equipe de transição vai começar nos próximos dias a fazer um trabalho, se o governador atual permitir que a equipe atual tenha aproximação, aí vamos fazer o levantamento.


Euler de França Belém — Do ponto de vista da sociedade goiana, não seria melhor que a Celg fosse vendida para a iniciativa privada do que ser encampada pela Eletrobrás? Se esse dinheiro não é liberado, o governo tem condições financeiras de viabilizá-lo?

Aí é que está o problema. Tem instrumentos de gestão que resolva o problema? Eu não tenho esses dados hoje. Penso que o senador Marconi Perillo também não tenha. A primeira coisa é saber: o governo pegou o empréstimo mesmo? A imprensa publicou que sim, mostrou o contrato assinado. Mas até agora eu não tenho ciência se está registrado esse contrato. Se não existir esse contrato, nós vamos buscar caminhos para solucionar os problemas da Celg. É preciso avaliar tecnicamente. Há condições operacionais de gestão para que a Celg seja recuperada? São indagações que devem ser feitas e o corpo técnico tem essa resposta. Não havendo, qual o melhor caminho? É a privatização, a federalização? Mas essa matéria tem que ser vista sob o viés técnico, não populista ou apenas demagógico.


Euler de França Belém — O sr. já pensou na hipótese de o governador Alcides deixar um déficit mensal para o governador Marconi?

Vamos deixar cada coisa em seu tempo.


Euler de França Belém — Como o sr. acha que será o próximo governo Marconi?

Tenho conversado muito com o senador Marconi e sinto nele um objetivo muito forte de fazer um governo transformador. De fazer um governo que marque a história de Goiás. Os dois governos dele já mudaram alguns parâmetros da relação da sociedade com a administração pública. Acredito que o próximo governo marcará não apenas pelos investimentos no segmento social, como também pelos fortes investimentos na infraestrutura. Outro diferencial será na área de educação. É preciso priorizar, pois não recursos para fazer tudo. Mas penso que, na educação, o próximo governo vai fazer a diferença e nós vamos marcar um tempo diferente na história de Goiás. Nessa área, tenho certeza que o senador Marconi vai buscar o melhor quadro para implementar políticas ousadas e para ter o melhor relacionamento com os profissionais. Depois da eleição, ele já concedeu entrevistas, enfatizando que o foco será a educação.


Danin Júnior — Então, as prioridades são educação e infraestrutura?

Penso que o marco de abrangência das ações do Estado, no próximo governo, pode ser resumido em dois pontos essenciais. Um é a eficiência dos serviços públicos e a geração de oportunidades. O outro é a priorização da educação. Essa vai ser a marca da administração.


Cezar Santos — É verdade que o sr. é cotado para a Secretaria de Segurança Pública?

Essa matéria nunca foi discutida, mesmo porque essa questão não se discute dessa forma. Ela deve ser uma discussão institucional. O partido vai discutir com o governador eleito qual o espaço que ele terá no governo e, depois, isso será discutido internamente. Eu não consigo conceber uma discussão individual, no varejo. Além disso, acho que essa discussão deve ser pautada pelo viés técnico. Se for aberto um espaço para o Democratas, ele deve ser ocupado por quadros técnicos para que possam trabalhar com eficiência e que esse trabalho signifique melhoria para o Estado. É claro que é preciso observar o critério político, mas não apenas isso.


Euler de França Belém — O nome do sr. também foi citado para integrar a comissão de transição. O sr. estaria disposto a participar?

Essa questão não foi discutida. Se for convocado, estou à disposição. Já falei que quero contribuir.


Cezar Santos — Foi a primeira campanha majoritária que o sr. participou. Aconteceu alguma coisa que o sr. considera curiosa, diferente, no dia a dia da campanha, nas andanças pelos municípios?

Não. Foi uma campanha normal. Eu fiquei muito feliz de participar dessa campanha. Eu já participava da política, mas nos bastidores, nunca como candidato. É uma oportunidade diferente. É difícil você passar a visão que o político tem do mundo, porque só quem participa do processo eleitoral, só quem pede voto tem essa consciência, porque você conhece realidades absolutamente distintas. Você tem uma visão de mundo diferenciada daquelas pessoas que ficam em seus gabinetes, em seus escritórios, em qualquer outra atividade. Eu falo isso porque era um advogado que militava nos tribunais e tive a oportunidade de ter essa visão. Então, o relacionamento pessoal é um negócio fantástico no processo eleitoral. Você tem uma visão de mundo diferente, consegue enxergar os valores da sociedade e perceber que, às vezes, pessoas simples pensam igualmente às pessoas estudadas, só que de forma diferente.


Euler de França Belém — O senador Demóstenes Torres afirmou que está disposto a disputar a Prefeitura de Goiânia. Como o sr. avalia esse projeto?

O partido que não tem projeto de poder, não é partido político, é sigla de aluguel. O DEM, como outros partidos, tem projetos para chegar à Prefeitura de Goiânia, ao governo do Estado e à Presidência da República. Vamos trabalhar para isso. Se o senador Demóstenes tiver a intenção de concorrer ao cargo, terá o nosso mais absoluto respaldo. Até porque é um quadro técnico da mais alta qualidade. Mas penso que este não é o momento adequado para se discutir a eleição de 2012. O prefeito Paulo Garcia tem mais dois anos de mandato. Temos com ele um relacionamento administrativo cordial e respeitoso.


Euler de França Belém — A sociedade goiana é conservadora ou não?

É conservadora. Não tenho dúvida de afirmar isso. Não falo no sentido pejorativo, pois eu me enquadro no pensamento conservador, mas a sociedade de um modo geral se pauta em valores tradicionais.


Euler de França Belém — A sociedade goiana tem mais mobilidade social? As pessoas conseguem mudar, se percebe isso?

Talvez nos grandes centros. Nas cidades pequenas eu enxergo estagnação social. Você não consegue ver mudanças nesses municípios menores, de menor potencial. Isso em todas as regiões. Alguns municípios vivem situação de estagnação mesmo.


Euler de França Belém — Por que nas campanhas vocês, políticos, têm discurso para os desvalidos e para os que têm posses, mas não têm para a classe média?

Nós tivemos um discurso muito forte para a classe média. A maioria das nossas propostas atende especificamente a classe média. No momento em que se fornecer uma escola pública de qualidade, você vai ter a classe média também nessa escola pública. Ela não vai à escola pública hoje, porque não há qualidade do serviço de educação. Eu cito exemplos: as universidades federais. Diziam que apenas os ricos entravam nas federais. Pegue as escolas técnicas federais em Goiás. A maior parte das pessoas que estudam lá vem de famílias de classe média e alta. No momento em que se fortalece e dá condições de trabalho para os professores, eles oferecem qualidade de ensino aos alunos, e é obvio que a classe média vai procurar essas escolas.


Euler de França Belém — Se procurar alguém da classe média e dizer isso, ninguém vai acreditar. Vai falar que isso é discurso de político. A classe média vai continuar matriculando seus filhos em escola particular e pagando plano de saúde.

Ai você está trabalhando sobre a hipótese do que a classe média vai pensar. Eu tenho certeza que se houver escolas com ensino de qualidade, a classe média irá matricular seus filhos nelas. A classe média se sacrifica para colocar os filhos em escolas caras, porque há deficiência de ensino. Se houver a convicção de que aquela escola vai fornecer um ensino de qualidade, irá colocar seu filho lá sem problema algum. O antigo Hugo de Carvalho Ramos ou o Colégio Aplicação da UFG são muito concorridos. Voltando à questão da proposta para a classe média, o Credec é um programa que beneficia diretamente ela. Nós temos propostas de empreendedorismo, de ampliação das ações do Banco do Povo para aplicação de microcréditos, esse também atinge a classe média.


Euler de França Belém — Marconi falou que vai aumentar o IDH dos goianos e que vai usar a educação para isso. Como colocar em prática?

O IDH é um conjunto de fatores, não será num passe de mágica que será resolvido. Aí nós temos que ter melhoria dos serviços de saúde, educação, infraestrutura do Estado. Eu sou de uma região, o Nordeste goiano, que tem o menor IDH de Goiás. O que falta lá? Não há problema acentuado de violência naquela região, mas há déficit de infraestrutura muito grande, energético, transporte, o isolamento de algumas cidades não permite o crescimento delas e falta investimento em saúde e educação. Isso faz com que as cidades vivam basicamente das prefeituras. Num município como Sítio d'Abadia o maior investidor da cidade é o poder público. Para melhorar o IDH desses municípios é preciso fazer ações conjuntas. É através das ações sociais de melhoria dos serviços públicos em todas as áreas que se conseguirá projetar o IDH.


“Lula extrapolou, passou dos limites”

Cezar Santos — Na campanha o presidente Lula desrespeitou todas as instituições ao pedir votos para sua candidata. O TSE não foi omisso?

O TSE não tem iniciativa. O Judiciário, como um todo, é um poder inerte. Precisa ser provocado para se manifestar. Agora, o Ministério Público foi inerte? Essa é a questão que precisa ser avaliada. Recentemente, por exemplo, teve uma crítica muito ácida do TSE em uma medida judicial contra a candidata dele. Então, se não houve provocação é porque as partes envolvidas, seja o Ministério Público, seja a coligação adversária, entenderam que os fatos não caracterizaram qualquer tipo de ilícito. Mas, na minha opinião, o Lula extrapolou, passou dos limites. Ele é o presidente da República.


Cezar Santos — A oposição dormiu no ponto?

Entendo que sim. A liturgia do cargo foi absolutamente ignorada pelo presidente. Ele esqueceu que é o presidente de todos os brasileiros, e não de uma facção do Brasil. Isso não o impediria de fazer campanha, de apoiar uma candidatura e de defender seus ideais. Mas ele deveria discernir entre a atuação do governante e a atuação político-partidária. Não se pode colocar a máquina a serviço de uma candidatura, seja ela qual for. O presidente Lula não conseguiu entender, até hoje, que o pressuposto da democracia é o respeito à divergência de opinião. No momento em que um presidente vai a um Estado e prega a extirpação de um partido político, isso é um absurdo. A oposição, inclusive, é salutar e essencial no processo político-eleitoral. A sociedade não cresce sem o debate. Já não disseram que a unanimidade é burra? É um viés típico dos partidos de esquerda.


Danin Júnior — E diante dessa ameaça de extirpação feita pelo presidente, qual é o futuro do DEM?

Tem um segmento do DEM que discute a fusão com outros partidos, mas não sei se isso acontecerá. Eu defendo a tese de que o DEM deve se consolidar como partido. Deve buscar uma posição ideológica clara, que já tem, de centro-direita. Existe um caminho aberto nesse segmento político no Brasil. Não temos um partido que se identifique com o pensamento mais conservador e há espaço para uma discussão dessa natureza ideológica no país. A maioria do espectro partidário, hoje, se diz de centro ou centro-esquerda, como o PT, o PSDB e o PTB. Hoje, o Brasil não tem um partido autêntico de centro-direita. O Democratas deveria assumir essa posição com clareza, manter um discurso conservador e discutir os grandes temas do país para que a sociedade, dentro de 4, 8, 12 ou 16 anos, possa contar com um projeto novo. Toda nação desenvolvida tem partidos de esquerda e partidos de direita porque são pensamentos diferentes. Nenhum é retrógrado ou avançado por si só. Há pensamentos de esquerda que são absolutamente retrógrados e tem pensamentos de direita que também são. Da mesma forma, as duas correntes possuem pensamentos que são modernos. Nós vamos focar nisso.


Danin Júnior — O sr. poderia dar um exemplo desse tipo de discussão ideológica?

Um tema essencial, que gerou um grande debate eleitoral, é o das privatizações. Nós precisamos discutir como deve ser a privatização e qual conduta vai ser melhor para o país. A economia de mercado, na qual vivemos, é a mais correta? Que tipo de economia de mercado é a ideal, a de Adam Smith, de anos atrás, ou a social-democrata? Porque o PT prega uma social-democracia. Não é propriamente um partido de esquerda. Eu defendo um Estado mínimo. Um Estado que se atenha às suas atividades-fim, como saúde, educação e segurança. E não um Estado que vai entrar em atividades da iniciativa privada. Então, a privatização trouxe grandes benefícios ao país e simplesmente foi ignorada e deturpada. E isso foi culpa das últimas três candidaturas do nosso campo ideológico. Tanto José Serra, quanto Geraldo Alckmin e Serra novamente [todos do PSDB, com apoio do DEM] simplesmente não tiveram coragem de defender o governo Fernando Henrique. Foi um governo que mudou a realidade política do Brasil, com grandes instrumentos de transformação. A privatização foi apenas um deles e sua discussão foi politizada no processo eleitoral. Foi politizada como essa questão do déficit e da Celg. Existem temas que precisamos transmitir de forma mais clara à sociedade para que ela perceba quais foram os avanços e os retrocessos.


Euler de França Belém — Essas discussões sobre fusões dos partidos, em vez de se discutir a reforma política, que seria mais importante, estão discutindo uma reforma partidária?

Eu sou um defensor do fim das coligações proporcionais porque isso fortaleceria os partidos políticos. Alguns partidos às vezes não têm identidade ideológica nenhuma e fazem coligação para eleger um parlamentar. No momento em que se retirar a possibilidade de coligação, eles necessariamente vão procurar fortalecer suas bases e ter um conteúdo ideológico para conquistar novos adeptos e políticos que possam participar do processo eleitoral. Eu também defendo a lista fechada. É uma ideia de difícil assimilação pelo povo brasileiro, pois não tradição nesse sentido. Dizem que isso vai transformar os partidos em siglas de caciques. No primeiro momento, sim. Aqueles que detêm o controle partidário certamente vão influenciar na escolha de nomes para a lista. Mas depois de cinco ou seis anos, as lideranças políticas que fazem parte dos partidos que pretendam crescer e almejar cargos políticos, vão desenvolver uma política interna partidária porque é a convenção que vai definir a ordem dos nomes na lista. Isso requer política interna muito forte e fortalece os partidos políticos. No atual sistema o que se tem é um balcão de conveniências.


Euler de França Belém — E o voto distrital?

Tenho dúvidas quanto à necessidade do voto distrital. Hoje, já funciona um sistema semelhante, que pode não ser distrital na forma, mas é na prática. Cada região elege um parlamentar mais identificado com ela. Álvaro Guimarães é da região Sul, Iso Moreira é do Nordeste, Júlio da Retífica é do Norte, Itamar Barreto é de outra região, Hildo do Candango é do Entorno, Cristóvão Tormin, Valcenor Braz e os demais provam isso. Na realidade, já existe o voto distrital.

“A família precisa ser fortalecida”

Euler de França Belém — O governo Lula diz que é o governo que mais aplicou na área social. Na interpretação do governo, a violência decorre de problemas sociais. No entanto, dados apresentados em reportagem do Jornal Opção mostram que a violência é crescente. Então, se foi reduzida a pobreza, não foi reduzida a violência. Segundo uma socióloga carioca, se está partindo do pressuposto que o pobre é ladrão, assassino. Quer dizer, se a condição financeira dele for melhorada, ele vai deixar de ser assassino e ladrão. Como o sr. avalia essa questão?

O governo federal tem um viés equivocado nessa questão. Investimento na área social é fundamental não pela questão específica da segurança pública. Se pegarmos os indicadores de violência no País, principalmente nos grandes centros, como Rio de Janeiro e São Paulo, há uma série de crimes envolvendo a classe média alta. Tráfico de drogas, jovens que querem consumir, isso acaba levando para uma violência imensurável. A raiz desse problema não está necessariamente na condição social da pessoa. Se é pobre, rico, remediado, isso não é determinante. Os investimentos nos programas sociais têm que ser transitórios para um problema pontual da realidade brasileira, de deficiência das famílias mais humildes com relação à subsistência. Isso não significa que com os programas sociais se estará investindo na segurança pública e no combate à criminalidade. Ao contrário, o combate à segurança passa por um processo de educação mais forte para consolidação da instituição família, através de programas de efetivo de fortalecimento da condição familiar, porque é no seio familiar que se desenvolve o caráter das pessoas. Não só o acompanhamento no dia a dia, porque o Estado não tem como atender a essa demanda, mas na discussão de programas de inclusão e valores sociais e valores da família, na formação educacional básica. Também, na outra ponta, de geração de empreendedorismo, porque quando se dá oportunidade às famílias de crescerem, obviamente surge a perspectiva de futuro. No momento em que ela tem a perspectiva de futuro, deixa de passar por essas situações. Voltando ao início da pergunta, não poderia se falar que uma família que mora em Copacabana pudesse ver seu filho se envolvendo com o crime, porque como se justificaria essas pessoas indo para o universo do crime? Um conjunto de eventos relacionados à juventude, à vida cotidiana, aos valores da sociedade, sobretudo da juventude de hoje, que acaba levando esses jovens ao consumo de drogas, é que gera esse tipo de violência. Nós temos que ter uma política de segurança pública absolutamente independente das políticas de inclusão social. Teremos que ter um programa de segurança pública que envolva os aspectos da repressão ao crime, da formação dos adolescentes e da educação de qualidade a essas famílias. Podem dizer que esse é um discurso conservador. Mas é conservador mesmo, é preciso fortalecer a instituição familiar com os valores da família brasileira. Na metade do século passado, nós não tínhamos os índices de violência que temos hoje, por quê? Porque tínhamos conceitos. As famílias transmitiam esses conceitos, a figura patriarcal era respeitada. Hoje, banalizaram-se por completo as relações familiares.


Euler de França Belém — No caso dos governos estaduais, o que eles podem fazer para melhorar a segurança? O que podem fazer para criar um relacionamento melhor com outros Estados próximos? No caso das drogas, por exemplo, o crack está vindo para Goiânia de Brasília. Como segurar isso?

Nós temos duas situações. A primeira diz respeito à competência da União. Os Estados é que têm competência para tratar da segurança pública. A União não trabalha especificamente com essa questão. O candidato José Serra tinha uma proposta de ampliar a atuação da União. A sociedade brasileira entendeu que o melhor projeto nesse instante é o da Dilma, ela não deixou isso claro, mas disse que vai combater. A União deve desenvolver junto aos Estados ações conjuntas. Vamos primeiro aos aspectos em que a União pode intervir. Questão de vigilância de fronteiras, que já foi extremamente debatida nessa campanha nacional, mas esse assunto não pode ser tratado de forma isolada. Tem-se que criar condições junto ao governo federal para fortalecimento das estruturas de inteligência das polícias. O governo federal vai trabalhar com a tentativa de bloquear a entrada de armamento e drogas no País e os governos estaduais devem ter uma política de segurança pública com eficiência na prestação de serviço. Ou seja, você tem que fortalecer as estruturas de segurança pública no interior, dar qualificação melhor ao profissional da segurança pública, os policiais civis e militares. Você pode comparar: a abordagem da Polícia Federal é de uma forma e das polícias estaduais de outra. É preciso dar treinamento, oportunidade ao policial de se aperfeiçoar, de fazer esse trabalho continuado, ou seja, de serviço de inteligência, e depois o trabalho de campo da polícia. Mas esse trabalho tem que ser feito em sintonia entre todas as esferas de poder. E os Estados trabalhando juntos com os órgãos de Estado, no sentido de buscar fortalecer o conjunto das ações de segurança pública.


Danin Júnior — A ex-candidata à presidência da Colômbia Ingrid Bettancourt disse que o Brasil deveria ter um posicionamento diferente em relação às Farc, reconhecê-la como facção terrorista mesmo, e não como um movimento social, como o governo federal tem feito. Há tolerância do governo tolerância com as Farc? Como uma das atividades de sustento da guerrilha é o narcotráfico, pode haver alguma influência no crescimento do narcotráfico no País?

Não vamos discutir especificamente as Farc. A política externa brasileira em vez de se basear nos interesses nacionais, se baseia em interesses ideológicos. Há um viés muito forte do Itamaraty de transformar a política externa em política de amigos. E amigos que pensam de forma igual àqueles que estão no poder. Basta pegar os exemplos. O mesmo fato ou fato similar que acontece em determinado país da América Central é visto de uma forma e no Irã é visto de outra forma. Qual a razão? Apenas o controle ideológico. A questão das Farc deve ser tratada de acordo com a gravidade que envolve o caso, e não com a condescendência em relação a ela. As Farc é um movimento criminoso, terrorista, que sequestra pessoas e tenta atingir seus objetivos através da força. No exercício das suas razões, se fosse no Direito brasileiro, seria crime. A política externa brasileira teve mudança equivocada. Essas questões devem ser tratadas de forma objetiva, como o Itamaraty sempre fez até então. Com essa mudança de posicionamento do Itamaraty, o Brasil regrediu em áreas que não era plausível o ingresso. Por exemplo, na questão do desarmamento nuclear do Irã, o Brasil foi patético. O Itamaraty acabou sendo criticado no mundo inteiro. Era apenas uma protelação das sanções da ONU que o presidente daquele País estava fazendo, e assim acabou sendo criticada a política externa brasileira, sob o viés muito mais dos camaradas do que dos interesses nacionais. Acho que essa questão específica das Farc tem que ser tratada sob o viés da segurança pública nacional, com instrumentos próprios para se vigiar as fronteiras, para evitar essa condescendência que muitas vezes afeta a relação entre os países.


Euler de França Belém — Os centros de tratamento de viciados que serão construídos por Marconi serão eficazes?

Os centros de tratamento têm a função de atacar a consequência do problema, não ataca as causa. Eles visam recuperar os jovens que já ingressaram no mundo das drogas. É preciso ter uma política específica para esse público, que ingressou nesse mundo e precisa ter recuperação. Hoje no sistema público de saúde não temos instituições eficientes para recuperação de dependentes químicos. As clínicas de recuperação no sistema privado têm custo muito alto, e pouquíssimas famílias têm condição de arcar com esse custo. Vejo com muita propriedade e tenho expectativas muito fortes na construção do Credec para que seja oportunidade de recuperação para quem necessita. É claro que vamos ter uma demanda muito grande de serviços, por isso precisamos estar aliados. Em relação à qualidade de serviço queremos ter aquele padrão do Crer em Goiânia. Mas e os dependentes das diversas regiões do Estado? Para isso, o governo já prevê a criação das sucursais tanto do Credec quanto do hospital da mulher, para fazer a triagem primeiro por lá mesmo e depois serem encaminhados para cá. É um projeto interessante e importante para atacar a consequência das drogas. Para atacar a causa nós temos outras circunstâncias, que começamos a discutir aqui, como investimento em educação, no fortalecimento da família e uma série de outros programas.


Euler de França Belém — O sr. falou em hospital da mulher. Não seria melhor hospitais universalizados para homem e mulher? Hospitais para mulher não é populista?

Não. Nós temos demanda específica com relação a algumas doenças que têm especificidade no segmento feminino. Este será um hospital para atender com excelência a esse público. A ideias das policlínicas, que era defendida pelo presidente Serra - e pela própria Dilma, mas com outro nome -, é uma outra proposta, que atende os interesses das diversas regiões. Criar as policlínicas nas diversas regiões do Estado para desafogar o sistema de saúde em Goiânia. Mas não pode parar nisso. Eu vivi muitos anos no interior, então sei que os municípios não têm condição de arcar sozinhos com os custos de saúde. Não adianta nada construir um senhor hospital, aparelhar e entregar ao município, porque ele não vai dar conta de bancar a estrutura, pagar salários dos médicos e a manutenção do hospital. É necessário criar mecanismos de convênio em que se possa dar condição aos municípios de manter o sistema de saúde mínimo para atender às demandas. Obviamente, depois disso, é preciso fazer o conjunto, para que todo o sistema de saúde funcione de forma equilibrada.


Danin Júnior — Haverá recursos e inteligência administrativa para se resolver tantos problemas na rede pública de saúde?

Milagre ninguém faz. Mas o trabalho tem que ser feito para melhorar a situação da saúde em Goiás nos diversos municípios. Tenho certeza que a presidente eleita vai tentar dar o encaminhamento positivo. Eu sempre falo que a área mais importante da administração pública é a educação, mas a mais sensível é a saúde. Tanto é que se você pegar os indicadores da população, saúde aparece como principal preocupação da sociedade. Há realidades diferentes no Estado. Goiânia tem um sistema de saúde que tem condições de atender as necessidades do goianiense. O que acontece é sobrecarga no sistema, porque como os outros municípios não têm estrutura, cria-se aquela teoria das ambulâncias, que carregam os pacientes para Goiânia e sobrecarregam todo o sistema de saúde. Então, é preciso criar instrumentos para fortalecer os hospitais municipais e o sistema já existente, além das policlínicas. Muitas vezes as pessoas não conseguem atendimento, consulta e exames, e quando vão a hospitais o estágio da doença já está avançado. Então, se há condição de fornecer atendimento preventivo, diminuem-se os problemas na área da saúde. Esse conjunto de ações deve ser feito em primeiro lugar com boa gestão, gestão eficiente do sistema de saúde. É preciso que o governante tenha consciência. Marconi quer dar eficiência a esses serviços. O exemplo tem que partir de cima para baixo. Eu defendo um governo que seja muito técnico em algumas áreas. A área da saúde precisa de pessoas com conhecimento técnico para dar eficiência. É possível fazer. Os recursos, se bem aplicados e da forma correta, darão resultados para a sociedade. Os goianos verão esses resultados daqui a quatro anos.


“Dilma está mudando de opinião”

Euler de França Belém — O que o sr. achou das declarações da presidente Dilma Rousseff, dizendo que não vai propor o controle da imprensa?

Muito bom. Está mudando de opinião. O respeito à imprensa é essencial. Foi Voltaire quem disse que não concordo com o que dizes, mas defendo até a morte o direito de dizê-lo. A imprensa, no Brasil, tem de ser livre. Não pode ter controle. A legislação já exerce um tipo de controle. Se uma publicação cometer algum equívoco, algum dano, já há mecanismos para a reparação. O que não pode é proibir o direito de se publicar. Cada veículo é responsável por suas ideias e por suas ações. Isso pressupõe responsabilidades. Igual naquela situação do Caiado com o escritor Fernando Morais, na qual diziam que ele queria censurar. Não queria censurar nada. Queria uma reparação ao dano que sofreu, já que foi dito no livro "Na Toca dos Leões" que ele era contra os nordestinos, o que não é verdade.


Euler de França Belém — E os erros nas pesquisas eleitorais, como no caso do Ibope, que errou muito e é acusado de manipular os dados. Há alguma forma de evitar que isso influencie no resultado das eleições?

Parto do pressuposto de que as pessoas são de bem, até prova em contrário. Então, não farei qualquer ilação. Mas o Ibope precisa se reciclar. Eles conseguiram a proeza de errar até a pesquisa boca-de-urna em Goiás, onde há um histórico de equívocos do instituto. Precisamos criar melhores instrumentos de regulação dessa matéria. Sou membro da comissão de juristas do Senado, que vai propor uma importante reforma no Código Eleitoral. Inclusive, nesta segunda-feira, 8, participarei de uma audiência pública em São Paulo e vou propor algumas medidas que visam mudar esse cenário. Um dos mecanismos é o que cria a responsabilização por esses erros flagrantes para que haja pelo menos uma fiscalização e eles sejam coibidos por meio de penalização, especialmente dos institutos que erram reiteradamente. Além disso, podemos discutir a proibição da veiculação de pesquisas em programas eleitorais. Podemos fiscalizar a metodologia aplicada também, verificando possíveis distorções. É possível imaginar um critério técnico que deva ser aplicado em todas as pesquisas, evitando que elas sejam feitas do jeito que qualquer um quiser.


Euler de França Belém — As redes sociais da internet influenciaram as eleições?

Influenciaram, sim. Especialmente a classe média, que é muito sensível. Hoje, as pessoas estão muito antenadas na internet. O movimento nas redes sociais foi muito intenso. Percebi isso nas quais participo, como o Twitter e o Facebook, pela quantidade de acessos e de mensagens. Também pelos debates que surgiam nas redes sociais e cresciam para outros segmentos. Alguns ataques foram absurdos, mas penso que é impossível criar algum controle para isso. Talvez seja o caso de começar pela escola essa discussão sobre o respeito à democracia.


Danin Júnior — O sr. é um advogado eleitoral. Qual sua avaliação da aplicação da Lei da Ficha Limpa?

Acho que faltou Supremo Tribunal enfrentar realmente o problema. O Supremo está dividido e não se posicionou. O projeto Ficha Limpa tem virtudes, mas tem defeitos muito relevantes do ponto de vista jurídico. A aplicação imediata dele viola a Constituição, sem dúvida alguma. Viola o princípio da retroatividade, das sanções da pena. Alguns casos são emblemáticos. Uma pessoa que foi condenada por uma infração eleitoral, cumpriu a sanção, se candidatou e foi eleita para um cargo, agora tem o registro indeferido por causa da ficha suja. Ora, é um absurdo. Como você vai sustentar isso perante a Constituição da República. Eu tenho reservas quanto a esses detalhes. E o princípio da presunção da inocência? Como nós vamos enfrentar essa questão, que é uma garantia constitucional também? Cito um exemplo claro: quem vai reparar o prejuízo eleitoral do Marlúcio Pereira [deputado do PT de Aparecida]? Algum ministro, algum tribunal vai reparar esse dano feito a ele? Ele foi condenado, o TRE de Goiás entendeu que um café da manhã ou algo assim caracterizou captação ilícita de sufrágio, fez o julgamento, e o TSE posteriormente, depois de encerrada a eleição, vem e fala com as palavras do ministro Marco Aurélio, que "era um absurdo ter dado para aquela representação afastando a condenação dele". Quem vai reparar esse dano? Marlúcio, Chico Abreu e Dr. Valdir Bastos foram os três envolvidos naquele episódio. Eu me preocupo muito quando o judiciário passa a ser judiciário de ouvido. A opinião pública é importante, mas o Judiciário tem que entender que o papel dele é preservar a legislação vigente. Vejo uma dificuldade de aplicação desse projeto. Acho que o projeto em si, na essência, é bom. Eu só coloco nesse momento é a forma. Cria uma sanção em que só o Judiciário pode dar a palavra final. Para mim, a solução dessa questão não passaria por esse cerceamento do direito de defesa. Você teria que criar instrumentos de ajuização do processo, de apuração do processo. Garantindo ampla defesa, mas agilizando o processo para que terminasse em julgado. O que acontece hoje é que temos um processo altamente burocrático, que dá margem para manobras e por isso ele se arrasta por anos. Não é impossível fazer isso. Um exemplo é a Justiça Eleitoral, que julga com rapidez. Há processos que se desenrolam por 40 anos, mas há outros que são julgados em um ou dois anos.


Euler de França Belém - Que teórico o influenciou no Direito?

Gosto do processualista Humberto Teodoro Júnior. No Direito Eleitoral, temos o José Jairo Gomes. Também admiro muito o constitucionalista Adriano Soares. Esses são os modernos, claro. Na história, gosto do Montesquieu e os grandes pensadores. Na literatura, gosto mais dos clássicos, como Balzac.

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