Artigo
Remoção arbitrária
Equipes da Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), via coordenação da Coleta Seletiva de Material Reciclável, com o apoio logístico da Agência Municipal de Trânsito iniciaram a remoção das carrocinhas dos catadores de papel das ruas e avenidas da capital goiana. Além de arbitrário, o procedimento é inconstitucional, intempestivo, injusto, desumano e fomentador da exclusão social.
A direção da Comurg alega que a medida é necessária porque o órgão implantará um projeto social, a longo prazo (sic), através do qual essa categoria marginalizada dos direitos sociais será incentivada a formar cooperativas onde terá “condições de vida mais digna”, argumenta.
Segundo a versão oficial, o material reciclável (papel, garrafas, plásticos, papelões e outros reaproveitáveis) ficará nos galpões das cooperativas dos catadores. Elas serão subsidiadas pela prefeitura e esses trabalhadores informais “terão melhores ganhos para subsistência deles e de suas famílias”. A intenção é boa.
Todavia, como atualmente há apenas seis cooperativas, enquanto outra está em fase de conclusão, ainda é muito cedo para a Prefeitura de Goiânia retirar das ruas o contingente desses excluídos sociais que vivem a coletar restolhos (o notório material reciclável), nas ruas e nas portas dos domicílios, para vendê-los em busca do miolo de pão de cada dia. O número desses humildes trabalhadores na capital é estimado em 2.500, segundo levantamento da jornalista Maria José Silva, que relatou, em ampla reportagem, o drama que eles vivenciam, no seu dia-a-dia, na geografia da metrópole goiana.
Com sensibilidade social, a jornalista do POPULAR narrou no texto a perseguição a um catador de papel, que chegou a ser monitorado por agentes de trânsito da AMT no eixo da Anhanguera. Estes, a certa altura, lhe entregaram uma notificação do órgão e, em seguida, apreenderam seu indispensável instrumento de trabalho!
A apreensão, além de ilegal, caracterizou abuso de poder? Será que o prefeito Iris Rezende tem conhecimento dessa arbitrariedade que vem sendo praticada contra esses excluídos sociais? Será que o presidente da Comurg, Wagner Siqueira, aprova essa ação opressora contra o trabalhador desamparado?
Por que a notificação da AMT para a retirada das carrocinhas das ruas de Goiânia? Eles estariam causando transtornos no trânsito? Se essa for a justificativa, a Comurg e a Agência Municipal de Trânsito ferem preceitos constitucionais por abuso de poder (CF, artigo 5º, inciso LXVIII).
Não há notícias de carrocinhas colidirem com veículos automotores, ao contrário do que ocorre com motoristas irresponsáveis e motoqueiros que não respeitam as normas do tráfego. Oprimir os mais fracos na escala social, além de crueldade, é covardia.
Os direitos sociais, entre eles o trabalho e a assistência aos desamparados, são garantidos pela Carta de 1988 (CF, artigo 6º). “A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (CF, artigo 5º, inciso XLI). Quanto ao apreensor e à violação ao direito de ir e vir do catador de papel, cabe mandado de segurança ou habeas-corpus preventivo.
Em recente artigo no POPULAR, o jornalista Washington Novaes, expert em ambientalismo, fez detalhado enfoque técnico sobre a situação dos catadores de papel, inclusive na esfera nacional. Lamentou a ausência de uma política séria para essa categoria de abandonados pelo poder público e também criticou a Prefeitura de Goiânia pela ação injusta que vem sendo praticada contra essa legião de trabalhadores humilhados e ofendidos nos seus direitos sociais.
Na condição de componente do Fórum da Coleta Seletiva de Material Reciclável e Inclusão Social, a auditora fiscal do Trabalho, Katleem Marla de Lima, em declarações a este jornal, falou com autoridade da função que exerce. Para ela, “a retirada brusca dos catadores de papel das ruas de Goiânia está ocorrendo de forma unilateral e vertical, sem o diálogo prévio com os trabalhadores”. É verdade.
Enfim, a Prefeitura de Goiânia deve primeiro planejar e organizar as cooperativas para amparar os catadores de papel. A remoção antecipada desses trabalhadores excluídos do processo social é arbitrária, ilegal e desumana.
Armando Acioli é jornalista
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