quinta-feira, 17 de junho de 2010

Reciclar e reaproveitar!







ARTIGO

DA REDAÇÃO






Washington Novaes

Eppur si muove (e no entanto ela se move), teria murmurado o físico, matemático e astrônomo Galileo Galilei, réu diante do tribunal da Inquisição, em 1633, depois de renegar sua teoria de que a Terra gira em torno do Sol e de que este é o centro do nosso universo - que contrariava a teoria oficial de que a Terra era o centro do universo. E no entanto o mundo se move, vem agora a tentação de escrever, diante de algumas notícias das últimas semanas sobre o mundo dos recursos hídricos, às voltas com tantos dramas.

Há poucas semanas (15/4), comentou-se neste espaço a notícia de que o BNDES já está financiando projetos de reparos e conservação das redes urbanas de água, na tentativa de reduzir o calamitoso índice de perdas no caminho entre as estações de tratamento e as residências e indústrias, situado hoje em uns 45% da água tratada, que se perde por furos e vazamentos nos canos, além de furtos. Isso permitirá às municipalidades optar por um caminho que é algumas vezes mais barato que implantar novas barragens, adutoras e estações de tratamento. É preciso que as prefeituras corram em busca da nova possibilidade e abandonem a velha visão de que só obras acima do solo têm visibilidade e se refletem em votos dos eleitores (os que pagam a conta).

Agora, vêm outras notícias que parecem demonstrar que o mundo se move - e na direção correta. Uma, sobre o projeto Aquapolo, que será implantado para reciclar água de esgotos e fornecer 1 mil litros por segundo (86,4 milhões de litros por dia) ao polo petroquímico do ABC paulista em Mauá, além de outras empresas e municípios próximos de sua adutora de 17 quilômetros, em São Caetano do Sul e Santo André. Hoje, o polo consome 500 litros por segundo do Rio Tamanduateí e 150 litros da rede de abastecimento. No projeto, R$ 252 milhões serão investidos nas próximas décadas, principalmente na implantação de uma estação de tratamento terciário de esgotos (Goiânia, por exemplo, só tem tratamento primário, que devolve aos cursos dágua cerca de 50% da matéria orgânica contida nos esgotos; o tratamento terciário trata toda a matéria orgânica, poluição química e outras). E com a reutilização de água, aumenta a disponibilidade de abastecimento da população paulistana (mais 350 mil pessoas, que poderão chegar a 600 mil).

Outra notícia importante é a do êxito progressivo do projeto, já em execução, de reciclagem de óleo de fritura no bairro Cerqueira César, em São Paulo, que permitiu reduzir em 26% as ações para desobstruir as redes de esgotos na região, já que o óleo funciona como aglutinador de resíduos jogados na rede de esgotos - pontas de cigarros, fio dental, cotonetes, preservativos, absorventes, etc. É um projeto desenvolvido pela ONG Trevo e a associação de moradores do bairro. Estes despejam o óleo de fritura em bombonas plásticas de 50 litros, fornecidas pela ONG, que o encaminha a usinas de biodiesel ou cooperativas de catadores de lixo. E o óleo é utilizado para fabricar, além do biodiesel, sabão, tintas a óleo e massa para vidraceiros, principalmente. Cerca de 11.500 residências em 1,6 mil condomínios da área (90% do total destes) aderiram ao projeto, que já está se estendendo a outras regiões da capital e interior - Osasco, Itapetininga, Lins, Jales, Presidente Prudente, Registro. Também a Universidade de São Paulo montou na Cidade Universitária uma usina de biodiesel, que destina 200 litros diários de resíduos (borra decantada, água de lavagem e glicerina) extraídos do óleo às pesquisas sobre sabão industrial, sabão fino e outras, inclusive em um biodigestor.

As perdas de água "são um câncer que mina as empresas do setor", disse na semana passada, em um congresso em São Paulo, o presidente da Associação Internacional da Água, Paul Reiter, comentando o que se esvai nas redes brasileiras. Na região metropolitana de São Paulo, entre 2004 e 2009, as perdas na rede baixaram de 32% da água que saía das estações de tratamento para 26%. E no último ano foram detectados 21 mil pontos de perda, que provocavam a perda anual de 5,4 bilhões de litros e prejuízo de R$18,5 milhões. Este ano pretende-se baixar para 24% e até 2019 investir R$3,4 bilhões no processo.

Os números paulistanos são sempre espetaculosos. Mais de 10 milhões de pessoas geram 61 milhões de litros de esgotos por hora, dos quais 57,6 milhões são coletados (há áreas enormes de ocupação irregular, sem redes) e 43,2 milhões tratados em diferentes níveis. Mas são despejados nos Rios Tietê, Tamanduateí e Pinheiros milhões de litros por hora, que constituem a causa principal do assoreamento nesses cursos. Só no Rio Tietê, o projeto de despoluição e desassoreamento, que vem sendo implantado desde 1992, já custou R$ 3 bilhões.

Em Goiás, os números são cercados de controvérsia. Segundo o IBGE, no Estado são coletados 36,2% dos esgotos (eram 37% em 2003). Segundo a Saneago, a coleta atingiu no ano passado 39,14% dos habitantes (eram 32,72% em 2004). E 87,51% das pessoas recebem água tratada em suas residências (eram 82,45% em 2004). Já o tratamento de esgotos atinge 86,6% do que é coletado (eram 76,1% em 2004), graças principalmente ao volume tratado na capital. Sejam quais forem os números é preciso avançar muito. E rapidamente, já que as deficiências no saneamento básico, respondem por 60% das internações na rede pública de saúde. E comprometem a qualidade de vida.

Washington Novaes é jornalista

Nenhum comentário:

Postar um comentário