terça-feira, 1 de junho de 2010

Aparecida: lixo a preço de ouro!







CIDADES


Aparecida paga muito mais por lixo
Contrato de urgência para serviços de lixo custa mais caro do que em cidades onde houve licitação

Almiro Marcos

O lixo em Aparecida de Goiânia custa mais para a população do que em outras cidades. O município paga 148,5% mais caro do que Anápolis por quilômetro varrido de ruas e logradouros. Também paga mais do que Brasília pelas toneladas de resíduos domiciliares coletados (127,2% a mais) e pela coleta de resíduos de serviços de saúde (89%). Aparecida tem o serviço prestado por uma empresa contratada em caráter emergencial, enquanto Anápolis e Brasília fizeram licitações.

Prefeitura de Aparecida e a empresa Vital Engenharia Ambiental têm um contrato que foi assinado no dia 1º de março deste ano. A validade é de 180 dias. A Vital substituiu a Construrban, que prestou o mesmo serviço, também em caráter de urgência, entre fevereiro de 2009 e fevereiro de 2010. Mesmo com os seis meses de duração do contrato anterior, a prefeitura não conseguiu fazer a licitação a tempo.

Reclamação partiu da Câmara municipal, de um dos poucos vereadores de oposição. “Não entendo como a prefeitura não encontrou tempo, desde o ano passado, para fazer uma licitação de verdade e preferiu fazer um novo contrato emergencial. Isso é um absurdo!”, reclama Manoel Nascimento (PSDB), um dos poucos que fazem oposição ao prefeito Maguito Vilela (PMDB). Ele disse que chegou a pensar em defender uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar o caso, mas abandonou a ideia diante da maioria do prefeito na Câmara. De 18 vereadores, no máximo 6 seriam oposição.

Os contratos emergenciais, aliás, foram alvo de investigação do Ministério Público (MP) local e já foram parar na justiça. A prefeitura justifica que a intenção era mesmo abrir um processo licitatório, mas que acabou não conseguindo organizá-lo a tempo. “Tentamos fazer um edital enxuto em janeiro e não conseguimos. Essa é uma licitação complexa”, argumenta o superintendente de licitações e pregão, Luiz Augusto de Sousa.

Sendo assim, enquanto a licitação de fato não vinha, a prefeitura decidiu pelo contrato de urgência. “Era um serviço que não podia ter descontinuidade. É questão de meio ambiente, saúde pública e cidadania”, ressalta o diretor de meio ambiente de Aparecida, Juliano Cardoso, pasta que responde pela coleta de lixo.

Mais caro

Só não há uma explicação clara a respeito de preço tão exagerado e acima de outras cidades. A prefeitura diz que a Vital Engenharia Ambiental apresentou o melhor preço e a melhor qualidade de serviços, já a própria empresa garante que o custo elevado está relacionado com as características do município de Aparecida de Goiânia.

De acordo com Luiz Augusto, superintendente de licitações, para a assinatura do contrato, a prefeitura observou as regras legais de pesquisa de preços junto a três empresas do ramo de atividades cadastradas pela Associação Brasileira de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). A proposta mais vantajosa e barata teria sido apresentada pela Valor Ambiental.

Mas por que uma proposta, em um dos casos, chega a ser quase uma vez e meia mais cara do que o mesmo serviço, exemplo do comparativo da varrição em Anápolis (R$ 24,70 o quilômetro) e Aparecida (R$ 55,72)? Para Luís Augusto, da Superintendência de Licitações, o preço praticado está conforme o de mercado. Os custos são relacionados com as unidades: quilômetros varridos para varrição e toneladas para coleta de lixo.

A Vital Engenharia Ambiental também defende o seu lado. “Os valores estão dentro da média, principalmente levando em consideração as características do município”, disse a empresa. A explicação sobre o que compõe um custo diferenciado e tão acima de outros lugares também é característica de Aparecida. “O preço dos serviços é formado por uma composição de custos, que depende de uma série de fatores, principalmente das características do município”, diz o e-mail.

O superintendente de licitações de Aparecida de Goiânia, Luís Augusto de Sousa, também lembra que Aparecida é uma cidade com características peculiares que tornam o processo complexo. “Trata-se de uma cidade muito dispersa, espalhada, com mais de 500 mil habitantes”, informa.

Estranhamento

Especialistas em licitações ouvidos pelo POPULAR estranharam uma diferença tão gritante entre os preços dos mesmos serviços pagos em Aparecida, Anápolis e Brasília. Segundo eles, normalmente há um custo um pouco mais caro entre um contrato emergencial com dispensa de licitação em comparação a uma concorrência pública. Mas nada tão exagerado. “A variação não é tão grande. É um caso que precisa ser melhor avaliado”, diz um analista técnico ligado à Secretaria da Fazenda de Goiás (Sefaz).

Nem o contrato emergencial nem as características físicas da cidade, para outro especialista, justificariam valores tão diferentes. “Está certo que em uma concorrência os preços caem. Mas com uma variação que chega a quase 150%, está disparatado. Se a gente for pensar do ponto de vista das características do município, então teríamos de imaginar que Aparecida tem uma vez e meia mais ruas a serem varridas”, diz.

Prefeitura quer fazer licitação neste ano

Almiro Marcos

Enquanto há contestações sobre os contratos emergenciais, a prefeitura de Aparecida corre contra o tempo para não precisar fazer um terceiro contrato assim que encerrar o atual. “Estamos trabalhando para conseguir fechar o edital ainda em junho. Não trabalhamos com a possibilidade de precisar fazer um novo contrato de urgência”, garante o superintendente de licitações e pregões de Aparecida, Luiz Augusto de Sousa.

Ele explicou que a prefeitura está buscando informações em outras cidades que fizeram licitações para o serviço de lixo para conseguir fazer um edital sem possibilidade de contestações. “Queremos evitar impugnações. Não podemos errar”, diz. Cidades como Goiânia e Curitiba foram usadas como exemplo.

Segundo Luiz Augusto, há uma determinação do próprio prefeito Maguito Vilela para que a licitação seja feita o mais rapidamente possível. “É um serviço essencial para a população e que não pode ser suspenso”, resume.

O superintendente lembra que quando a prefeitura tentou abrir uma licitação, em janeiro, foram mais de 20 empresas interessadas. “Mas o edital apresentou problemas, tivemos sete impugnações e resolvemos revogar aquela concorrência para abrir uma nova posteriormente”, salienta.

O edital em fase de conclusão, destina-se ao serviço de coleta e tratamento de lixo em Aparecida e terá duração de 60 meses, no total. “Fizemos um estudo para identificar as necessidades de Aparecida”, completa Luiz Augusto.

Contratos da empresa já foram contestados

Almiro Marcos

A Vital Engenharia Ambiental, que está responsável pelos serviços emergenciais de varrição, coleta de lixo domiciliar e de saúde, e aterro sanitário em Aparecida, foi criada em 2007. Ela é braço do Grupo Queiroz Galvão. A empresa atua em dez cidades.

Os serviços prestados foram motivos de contestações parlamentares ou judiciais em pelo menos dois locais: Recife (PE) e Guarujá (SP). A empresa disse que prestou todas as informações que lhe foram solicitadas em todos os casos.

A Vital Engenharia Ambiental informou ao POPULAR que pretende participar como concorrente na licitação a ser aberta em breve em Aparecida de Goiânia.

No início dos trabalhos na cidade goiana, em março, houve muitas reclamações de moradores da cidade. Em vários bairros, o serviço apresentou problemas. De acordo com a empresa, o motivo foi “uma transição entre a forma da prefeitura e da Vital operar o sistema, estando o serviço normalizado desde a segunda semana de março”.

O diretor de meio ambiente de Aparecida, Juliano Cardoso, confessa que o serviço ainda apresenta problemas, apesar de já ter melhorado sensivelmente. “Houve um salto de qualidade, mas ainda não atendemos 100%”, conclui. O município produz mensalmente pouco mais de 20 mil toneladas de lixo.


ANÁLISE

Dinheiro público no lixo?

Aparecida de Goiânia tem uma vez e meia mais ruas para varrer do que Anápolis? Aparecida tem mais de uma vez mais dificuldades ou mais quantidade de lixo domiciliar para coletar do que Brasília? O município apresenta características que tornem a coleta de lixo da saúde quase 90% mais cara do que na capital federal?

Mesmo leigos no assunto podem perceber que há muito a ser explicado nessa história. A principal justificativa da Vital Engenharia Ambiental para os preços altos que estão sendo cobrados em Aparecida são as “características do município”. Quais seriam?

Ninguém discute que a coleta e o tratamento de lixo são essenciais. Ninguém vai contestar que é questão de saúde pública e cidadania. Mas também ninguém pode se fazer de cego diante da situação. Afinal, pode ser dinheiro público indo parar no lixo. E esclarecer nunca é demais. (A.M.)

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