sexta-feira, 11 de junho de 2010

Lição de história!






ARTIGO





Itami Campos


Revendo legislaturas

No seu registro a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás está na 16ª Legislatura, enquanto o Congresso Nacional está na 53ª Legislatura. O tempo em que a casa legislativa desempenha suas atividades, quase sempre equivale à duração de mandato do parlamentar, marcando também o tempo da presença do Legislativo na sociedade. Vale, então, perguntar por que a diferença entre as do Congresso (53ª) e as da Assembleia de Goiás (16ª). A resposta não é simples e envolve considerações não de número, mas de história.

Considerando-se os trabalhos legislativos em Goiás, desde a instalação da Assembleia Legislativa Provincial em 1º de junho de 1835, houve 47 Legislaturas no Parlamento goiano - 19 no Império, 11 na Primeira República (1890-1930), uma única legislatura no pós-30 ( de 1935 a 1937) e 16 no período posterior ao Estado Novo (1947-2011). E o Congresso Nacional está na 53ª porque em 1979 refez a contagem, incluindo as legislaturas desde 1826 quando tem início os trabalhos legislativos no Império brasileiro. Destaque-se que algumas Assembleias Legislativas seguem também a contagem do Império, outras o início da República. A maioria, contudo, considera apenas as 16 Legislaturas iniciadas no pós-1945.

As razões dessa diferença de registro das legislaturas são muitas. Entre os motivos deve se considerar como importante o desconhecimento da história, especialmente a regional. Até quase os anos 1970, a história da república, em Goiás, era pouco pesquisada e desconhecida. Quase todo conhecimento e publicações versavam sobre o período da Colônia e do Império. Eis a importância da contribuição de escritores e de historiadores goianos - Americano do Brasil, Zoroastro Artiaga, Colemar Natal e Silva, entre outros. Vale também registrar a importância de memorialistas, tais como S. Fleury Curado, Ricardo Paranhos, Moisés Santana, Joaquim Rosa, Claro Godoy, Jaime Câmara, Humberto Crispim.

No início dos anos 1970, eram muitos os estudos de história regional em elaboração. Padre Palacín, Sérgio Paulo Moreira, Dalísia Martins Dolles, Maria Augusta Sant'Anna de Morais, Gilka Vasconcelos de Sales, Lena Castelo Branco, Paulo Bertran, Ana Lúcia da Silva, Lauro Vasconcelos, entre outros, debruçavam-se sobre documentos e jornais escrevendo sobre o passado de Goiás, quase todos ligados ao Mestrado em História do ICHL/UFG.

Testemunho esse empenho, pois também me envolvia na pesquisa para minha dissertação Coronelismo em Estado Periférico, defendida no Mestrado em Ciência Política na UFMG em 1975 e que deu origem ao livro Coronelismo em Goiás. Além do importante trabalho de Maria Augusta sobre os Bulhões, originário de tese defendida na USP, não havia publicação sobre o período republicano, em Goiás. Daí a dificuldade em refazer a composição da Assembleia Legislativa de Goiás, a partir do início da República.

Ao que tudo indica, existe outro problema que vai além do desconhecimento da história, qual seja o de ignorar o período imediatamente anterior, por considerá-lo superado ou que deva ser esquecido. Assim, os governantes e líderes do pós-1930 não consideravam o período da Primeira República (1889-1930), era para ser esquecido... E, tudo começa com a Revolução, Nova República, e sua chegada ao poder. Talvez por isso a Legislatura, iniciada em 1935, não dá continuidade às 11 Legislaturas anteriores a 1930. Igualmente assim se comportam os governantes e líderes em 1945. A ditadura do Estado Novo (1937-1945) devia ser esquecida, além de parte dela coincidir com a Segunda Guerra Mundial. O pós-guerra, a democracia vitoriosa na guerra eram augúrio de tempos novos, com eleições presidenciais, um Congresso funcionando e um nova Constituição (1946). Por isso mesmo, o período legislativo a partir de 1947 não considerava o passado, nem as 12 legislaturas havidas, embora em 1947 tenha funcionado inicialmente com o Regimento Interno de 1935-1937. Estranhamente também não reconheceu como seu o prédio construído em Goiânia, em início de 1937, e que abrigou a Assembleia Legislativa em 40 sessões legislativas a partir de 1º de junho daquele ano.

De qualquer forma, o desenvolvimento da pesquisa e do conhecimento faz com que a Assembleia possa ver o passado de forma menos parcial e tirar proveito desse conhecimento, repensando o seu passado e projetando um futuro de respeito à cidadania.


 Itami Campos é cientista político, autor de O Legislativo em Goiás, volumes I, II, III. www.itamicampos.com

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