segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Jardel: nada a toque de caixa!





Política & Justiça

“Celg é desculpa para governo fazer caixa”
Deputado critica governador Alcides Rodrigues por operação mal explicada que pretende injetar R$ 750 milhões nos cofres da Sefaz em fim de mandato

José Barbacena

Nos termos em que foi enviada à Assembleia Legislativa, a mensagem que autoriza o empréstimo de R$ 3,7 bilhões para a Celg não deve ser aprovada. É o que prevê a maioria dos deputados estaduais, temerosos com o efeito negativo que a operação pode causar ao Estado. Entre os parlamentares que não concordam com o contrato sugerido pelo governo está o deputado estadual Jardel Sebba (PSDB). Em entrevista ao Diário da Manhã, Jardel lembra que a administração Alcides Rodrigues (PP) pretende usar R$ 750 milhões do valor total para quitar uma dívida que a estatal possui com o governo e, assim, provocar um fluxo extra de caixa no “apagar das luzes” do mandato do pepista. “Eu vejo mesmo essa politização e razões eleitorais, mas pelo governo. É ele que quer, a todo custo, usar todo esse dinheiro em pleno processo eleitoral.” Veja os melhores trechos da entrevista.


Diário da Manhã – Quais são as perspectivas para a tramitação da mensagem do governo que autoriza o empréstimo para salvar a Celg?

Jardel Sebba – Normais. Uma mensagem como essa, que envolve quase R$ 4 bilhões, deve ser muito bem avaliada pela Assembleia Legislativa. Representa um aumento nas dívidas estaduais acima dos 30%. Portanto, é natural que os parlamentares queiram conhecer a fundo o que está sendo proposto. Essa é a nossa obrigação.

DM – Mas o governo alega que se não for votada rapidamente a Celg poderá ter a sua concessão cassada.

Jardel – Esta é a quinta mensagem enviada pelo governo, e sempre se alegou a mesma coisa: essa ameaça de caducidade da concessão da Celg. Mas, mesmo que desta vez seja verdade, por que o governo não se apressou antes e só agora mandou a mensagem para a Assembleia Legislativa?

DM – O próprio governador Alcides Rodrigues disse textualmente que esta é a última chance para salvar a Celg. Isso não é justifica suficiente para uma tramitação da mensagem mais rapidamente?

Jardel – Se ele diz que esta é a última chance, significa que existiram outras. Por que, então, ele não aproveitou as chances de salvar a Celg antes? Quais foram as outras chances que este governo perdeu, deixou de aproveitar?

DM – O que o governo alega é que as bancadas do PSDB e do PMDB estão politizando o que seria uma questão técnica. O problema é mesmo a proximidade da eleição?

Jardel – Quem politizou as soluções para a Celg foi o presidente Lula, que, ao lado do governador Alcides, levou o assunto para cima de um palanque. Não fomos nós, deputados, que fizemos isso. Foram eles.

DM – Mas fica a impressão que o problema é a eleição.

Jardel – Por que fica essa impressão? Porque o governo quer usar R$ 750 milhões do dinheiro que deveria ir somente para a Celg. Eu vejo mesmo essa politização e razões eleitorais, mas pelo governo. É ele que quer, a todo custo, usar todo esse dinheiro em pleno processo eleitoral.

DM – A mensagem, então, não será aprovada?

Jardel – Da forma como foi enviada, eu acho muito difícil. Você já leu a lei? Lá não diz nada. É genérica. Fala que o governo fica autorizado a contrair empréstimo com o Banco do Brasil, com a Caixa Econômica, com fundos especiais ou com instituições financeiras indicadas pelo governo federal. Ao mesmo tempo, o governo Alcides diz que o dinheiro sairá da Caixa Econômica. Por que autorizar um leque vastíssimo como esse se o governo garante que já está tudo acertado com a Caixa?

DM – Talvez o acerto com a Caixa possa ter sido feito após a mensagem ter sido enviada. Não seria razoável?

Jardel – Aí é pior. Mostraria improviso. É por isso e tantas outras coisas que os deputados querem debater esse assunto a fundo. Na lei também não diz nada sobre prazo, carências, taxas de juros. Não existe nada disso na lei enviada pelo governador.

DM – Mas o governo divulgou os termos do acordo. Prazo de 20 anos, com dois anos de carência, e o escalonamento dos repasses. Isso não é suficiente?

Jardel – O que vale é o que está escrito na lei, e não o que dizem por aí. E na lei não tem nada disso que você está falando, que o governo divulgou. Se está tudo certo dessa forma, então, a lei que está na Assembleia deve ser modificada. Seria interessante que o jornal publicasse a lei que está para ser votada. Aí a população teria conhecimento do que está na Assembleia Legislativa. Não há nada disso aí que o governo fala.

DM – O setor empresarial, entre outros, também pede pressa na aprovação dessa lei.

Jardel – Se a lei fosse exatamente como o governo diz que será, não tenho nenhuma dúvida que ela seria aprovada rapidamente. Eu concordo com o setor empresarial: precisamos resolver rápido o problema da Celg, mas para solucionar deve ser apresentada uma solução real, transparente, exequível. Ser a favor da Celg todo mundo é. A divergência é quanto à maneira de resolver. O que o governo está propondo não diz nada.

DM – Não diz que o dinheiro irá para a Celg?

Jardel – Esse é um dos pontos mais complicados na lei. O dinheiro vai para a Celg, mas cerca de R$ 750 milhões voltarão imediatamente para os cofres estaduais como pagamento de ICMS. Funciona como se existissem dois empréstimos: um para Celg e outro para o governo. Na prática, o governo quer arrumar dinheiro emprestado para receber imposto atrasado de sua própria empresa, mesmo devendo mais do que tem para receber.

DM – Mas imposto atrasado não deve ser pago?

Jardel – Nesse caso, bastaria dar a quitação da dívida e entregar o que sobrar para a Celg, que, aí, pagaria a Eletrobras e se tornaria adimplente novamente. Essa ida e volta de dinheiro é que não está certa. Esconde uma operação que visa entregar para o governo quase um bilhão de reais a dois ou três meses do final do mandato.

DM – O governo diz que não vai pressionar a Assembleia Legislativa para aprovar o pedido de empréstimo e que, se não for aprovado, a Celg sofrerá intervenção. Isso não vai intimidar os deputados?

Jardel – Essa é outra historinha que o governador criou. Ele tem pressionado sim. Se ele tivesse apoio da maioria na Casa, já teria passado um rolo compressor. Felizmente, o governo é minoria e precisa discutir para conseguir aprovação das suas propostas. Só que ele não tem discutido essa mensagem. Democraticamente, sempre que existe um ponto de total divergência, como é o caso, deve-se começar pelas convergências. Todos são favoráveis a salvar a Celg. Então, vamos nos concentrar nisso. Podemos aprovar muito rapidamente uma lei que permita ao governo arrumar dinheiro emprestado para pagar suas pendências com o sistema elétrico, que seria a razão da ameaça de caducidade. Feito isso e com a Celg já protegida, então, podemos discutir o pagamento do ICMS, os R$ 750 milhões que o governo quer colocar nos cofres usando como desculpa a própria Celg.

DM – Mas e se a Aneel decretar a caducidade da concessão nesse meio tempo?

Jardel – Por que decretaria se o pagamento seria feito imediatamente? Se o governo quer mesmo resolver o problema de inadimplência da Celg, precisa se concentrar nisso. Não pode querer enganar todo mundo e usar a Celg para receber R$ 750 milhões. O que está ameaçando a Celg é a falta de pagamento do sistema elétrico nacional ou o ICMS atrasado? É a falta de pagamento da Eletrobras. Se a Celg pagar essa dívida, acaba, na mesma hora, qualquer tipo de ameaça. Não é por causa do atraso no ICMS que a Celg sofreria intervenção ou caducidade. Na verdade, estou convicto de que o governo não quer salvar a Celg coisa nenhuma. Se quisesse mesmo, modificaria a lei que enviou para a Assembleia Legislativa, garantindo o pagamento imediato das dívidas que a ameaçam, deixando para discutir depois o ICMS.

DM – O senhor está afirmando que o governo não quer resolver o problema da Celg?

Jardel – Pelo menos, está agindo como se não quisesse resolver o problema da Celg, mas os seus próprios problemas administrativos, políticos e até eleitorais. Tanto é verdade que R$ 750 milhões da primeira parcela do empréstimo da Celg não ficarão com a empresa, e, sim, com o caixa da Secretaria da Fazenda. Se o governo tem mesmo interesse em resolver os problemas imediatos e ameaçadores da Celg, então, vamos resolver isso já. Depois a gente terá até mais tempo para discutir e encontrar a melhor solução para o problema do ICMS. Até porque, estamos falando do governo e da dívida de uma empresa que pertence a esse mesmo governo. Está tudo em casa.

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