terça-feira, 24 de agosto de 2010

Marconi: evitando o caos na Celg!





OPERAÇÃO CELG
                                             Fernando Leite/Jornal Opção
Nos bastidores, equipe do governadoriável formatou um modelo para o empréstimo que pode finalmente salvar a Celg
Com um toque de Marconi
Demonstrando capacidade técnica para formular uma proposta inquestionável e grande poder de articulação, grupo do senador tucano vence “turno antecipado” da eleição

DANIN JÚNIOR

Goiás entra na segunda década do século 21 como um dos Estados brasileiros com crescimento econômico mais consistente e um dos mais atrativos para novos investimentos. Entre 2002 e 2007 (última estatística estadualizada do PIB), crescemos a um ritmo 12% superior à média nacional. Além de bater recordes na geração de empregos, temos a nona economia do país e a oitava posição no ranking de Estados mais competitivos – referencial que agrega fatores como localização geográfica, recursos naturais, infraestrutura e disponibilidade de mão de obra. O Índice de Desenvolvimento Humano (que soma renda per capita, educação e saúde) também aponta Goiás entre as melhores unidades federativas.

Ao lado desses indicadores positivos a população de Goiás tem mais um bom motivo para comemorar: sua representação política desfruta de uma maturidade como muito poucos lugares no Brasil. Prova dessa maturidade foi dada na semana passada, quando a Assembleia Legislativa impôs uma impressionante derrota ao Executivo. Aconteceu na votação do projeto que autoriza o governo a comandar a tomada de R$ 3,728 bilhões em empréstimo para, como diz o Executivo, salvar as finanças da Celg. A derrota do governo começou na comissão mista que analisou o projeto. O relator da matéria, deputado Daniel Messac (PSDB), conseguiu aprovar seu substitutivo que blinda a primeira parcela do empréstimo: os recursos devem ser aplicados diretamente no caixa da Celg. O governo queria que o dinheiro entrasse diretamente no Tesouro estadual.

O placar na comissão mista, com 22 votos a 13 contra o governo, ainda não tinha sido visto na atual legislatura. Até mesmo na história do parlamento goiano, poucas vezes a oposição obteve uma margem tão folgada de votos. Após essa primeira votação, o resultado no plenário era previsível: o projeto foi aprovado com 38 dos 41 votos da Casa. Para os analistas políticos, a conclusão mais óbvia não poderia ser diferente: a cerca de 40 dias das eleições, o desempenho do governo na Assembleia reflete a difícil performance de seu projeto eleitoral, com Vanderlan Cardoso (PR) muito mal nas pesquisas. Ou seja, os deputados votaram de acordo com a perspectiva de poder que se vive neste momento, girando em torno principalmente do candidato do PSDB, o senador Marconi Perillo, que foi o grande articulador das mudanças feitas no projeto do empréstimo.

Dessa forma, a aprovação do substitutivo foi mais que uma prova de maturidade política do Estado. Foi uma outra coisa também: uma demonstração indubitável da extrema consistência (técnica e política) do grupo do tucano. Nos últimos meses, os operadores de Marconi acompanharam, nos bastidores, toda a negociação empreendida entre o governo estadual, a União e a Eletrobras. Ao lado do senador estão alguns dos mais experimentados técnicos que já atuaram no setor público em Goiás, incluindo quadros que já passaram por todos os cargos de comando da Celg. Eles aguardavam que o projeto final chegasse à Assembleia com preocupações bastante justificáveis. Segundo um deles, o maior temor era o de que o empréstimo se tornasse "uma nova Cachoeira Dourada". Ou seja, que o dinheiro (tomado em nome da Celg) acabasse se pulverizando em outras áreas do governo.

Havia também o receio de que o dinheiro fosse usado politicamente. Essa preocupação tinha fundamento. Primeiro, vive-se um processo eleitoral com o candidato governista enfrentando dificuldades conhecidas. Segundo, os próprios representantes do governo (deputados e até o governadoriável Vanderlan) falaram abertamente que essa primeira parcela deveria entrar nos cofres do Estado (via quitação dos débitos da Celg relativos ao ICMS) para ser repassada a convênios já firmados com os municípios. Se isso ocorresse, a estatal, novamente seria preterida. E, como diz Daniel Messac, essa primeira parcela pode ser a única que a Celg terá direito – uma vez que o limite de endividamento do Estado já foi estourado.

Orientado pela equipe do senador, Messac entregou um modelo para o empréstimo que não deixa margem para críticas. O objetivo propalado pelo governo para assumir mais um comprometimento da receita do Estado é mesmo salvar a Celg? Então, não há o que discutir, pois o dinheiro passou a ser carimbado especificamente para a estatal. As mudanças podem levar as negociações com a Eletrobras à estaca zero? Impossível. Segundo o deputado Romilton Moraes (PMDB), ex-secretário da Fazenda, o contrato do empréstimo ainda está em fase de protocolo, o que permite ajustes. Além disso, continua o peemedebista, o projeto, como foi aprovado, atende aos requisitos da estatal federal e, inclusive, oferece mais segurança para o modelo de gestão que ela pretende impor à Celg. “Quem diz que as mudanças vão atrapalhar a negociação desconhece a legislação”, diz ele.

De forma subliminar, o projeto aprovado pela Assembleia também silencia o questionamento colocado por alguns dos governistas durante os momentos críticos em que matéria foi avaliada na comissão mista. Para alguns observadores, esse questionamento era uma forma de ameaça, pois eles disseram várias vezes que os municípios seriam penalizados por conta do impacto da inadimplência da Celg na arrecadação do ICMS. Ocorre que isso não é verdade. De acordo com o presidente da Associação Goiana de Municípios (AGM), Abelardo Vaz (PP), a grande maioria das cidades goianas depende muito mais do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) do que dos repasses do ICMS. A penúria dos prefeitos tem muito mais a ver com a queda do FPM do que com os problemas do ICMS. Além disso, sabe-se que a arrecadação sobre a circulação de mercadorias em Goiás vem crescendo acima da média nacional.

Embora ele próprio evite falar dessa maneira sobre o que se passou na Assembleia, o certo é que a operação de salvamento da Celg passa, agora, a ter as digitais de Marconi Perillo. Além de ajudar a formular o modelo para o projeto do empréstimo, seu grupo mostrou, novamente, grande poder de articulação, tendo atraído até os votos do PMDB (cinco na comissão mista). Na verdade, sob o prisma da perspectiva de poder, a votação da Assembleia foi uma espécie de turno antecipado das eleições de outubro. E como em outros movimentos da campanha, Marconi tem sido o candidato que mais acerta e menos erra. Diante do que aconteceu até agora, seus adversários, Iris Rezende (PMDB) e Vanderlan, ainda parecem inertes, vendo o jogo chegar ao fim sem conseguir um único lance favorável.

                                                         Leoiran
O deputado Daniel Messac (PSDB), autor da emenda que alterou o projeto do governo:?“Questão da Celg é política”

“Estado ficaria com quase tudo”
Autor da emenda que garante que os recursos sejam aplicados na Celg, Daniel Messac afirma que a intenção do governo seria ficar com a maior parte da primeira parcela

INÃ ZOÉ

O deputado Daniel Messac (PSDB) foi a “ferramenta” que possibilitou reverter a hegemonia do governo na Assembleia Legislativa. Nesta entrevista exclusiva, ele conta como foram os bastidores da aprovação de seu projeto substitutivo na noite de quarta-feira, 18. A emenda proposta por Messac (após consultas a técnicos da Celg e do governo federal) garante o uso do dinheiro do empréstimo exclsuivamente na quitação dos débitos da Celg com a Eletrobras. Tal procedimento, além de evitar os riscos de desvio de função dos recursos, possibilitará mais margem para que a estatal saia da crise e passe a investir. O deputado afirma uma coisa impressionante: o governo já estaria com uma operação pronta para incorporar a primeira parcela do empréstimo, por meio de uma multa e da cobrança do ICMS que a Celg deve ao Estado. Além de destacar o sacrifício que o empréstimo deve causar à administração do Estado (pois comprometerá os repasses do FPE) Messac faz outra afirmação polêmica: devido aos limites legais para endividamento do Estado, a primeira parcela do empréstimo pode ser a única que o Estado vai conseguir. “Ou se pega esses recursos agora e aplica tudo na Celg ou a situação ficaria difícil”, diz ele.


O que muda de concreto com a aprovação do projeto alterado pelo senhor?

O que muda concretamente é que o recurso não vai para o caixa do Estado. Ele vai para o caixa da Celg e, consequentemente, fará o pagamento da dívida junto à Eletrobras. O protocolo de intenções diz que a prioridade é o pagamento da dívida, tornando a Celg adimplente. Quem pode torná-la adimplente é a Eletrobrás. Então, a prioridade é o pagamento junto à estatal. Também garantimos o pagamento do ICMS, que é devido aos municípios. Também autorizamos no projeto o encontro de contas entre a Celg e o Estado.

Como será feito o encontro de contas?

A Celg deve pouco mais de R$ 600 milhões de ICMS, mas o Estado deve à Celg em torno de R$ 1,7 bilhão. Ainda que façam o encontro de contas, o Estado continuará devendo à Celg em torno de R$ 1 bilhão. Esse recurso vai possibilitar à empresa sair dessa situação de falência. O empréstimo só resolverá o problema da Celg se o dinheiro entrar em seu caixa para poder quitar a dívida. Quando venderam Corumbá IV, o recurso não foi para o caixa da Celg. Quando venderam a usina de Cachoeira Dourada, o recurso também não foi para o caixa da Celg, foi para o caixa do governo. Com esse empréstimo, a Celg vai cobrir o débito que tem junto à Eletrobras. Vai continuar a prestar serviço para a Eletrobras, como esses programas de eletrificação rural, por exemplo. No débito total viria se somar mais esse débito. Na realidade o Estado quer receber dela, mas não quer pagar. Que tipo de interesse o Estado tem em salvar a Celg se é péssimo pagador?


O Estado deve RS 1,7 bi a Celg. De onde surgiu a dívida?

Não sei com exatidão. O que sabemos é que entre os problemas está a venda de energia. Tenho informações, inclusive, que precisam ser investigadas. Funcionários da Celg me procuraram, preocupados. Pediram que não deixassem o dinheiro cair no caixa do Estado. Dizem que tem uma segunda parcela. O limite de endividamento, segundo a Constituição, a lei de responsabilidade fiscal e uma resolução aprovada pelo Senado, é 16% da receita corrente líquida. Esse porcentual daria R$ 1,410 bilhão. Mandaram uma proposta pedindo autorização para contrair empréstimo de R$ 3,728 bilhões, e já tem aí autorizado a venda de 7% das ações, que dariam R$ 139 milhões. Se a capacidade é R$ 1,4 bilhão, só virá a primeira parcela. Um funcionário me falou que a Celg foi multada pela Secretaria da Fazenda. Tenho informações de que foi em R$ 200 milhões, outra de que foi em R$ 500 milhões, em função do atraso do pagamento do ICMS. Multaram a Celg na véspera de sair este empréstimo. Pega-se essa multa, soma ao que ela tem de dívida e já daria quase o valor do empréstimo. Pegariam tudo. Ninguém quis falar dessa multa, fiquei sabendo por um funcionário.

Como fica a capacidade de endividamento do Estado?

A capacidade fica comprometida. Mas se o recurso for de fato aplicado na Celg estamos satisfeitos. Nossa preocupação era que o recurso não fosse aplicado na Celg. Mas isso ficou assegurado no projeto. A capacidade de endividamento está comprometida, depende agora do aumento da arrecadação. Ela é que vai alterar essa situação. Esse R$ 1,2 bi ainda está dentro do limite. Não podemos ultrapassar os 16%.

Foi uma grande união em torno do projeto para garantir a vitória...

Interessante é que começamos com poucos deputados. Foi crescendo à medida em que mostramos a situação. Que a prioridade número um seria o pagamento da dívida e que isso torna a Celg adimplente. Que nosso substitutivo garantia essa prioridade número um. Fizemos o convencimento um a um, mesmo o governo tendo uma força muito grande.

Como fica agora a situação com a Eletrobrás?

Ela está dentro do que foi pactuado. Prioridade número um é o pagamento da Eletrobrás. Agora sim vai ser cumprido o que estava escrito no acordo.

Então não vai haver nenhum problema com a Eletrobrás?

A única questão que pode ter é a falta de vontade política para resolver o problema da Celg.

Nesse momento ainda pode haver falta de vontade política?

Penso que não. A equipe do governo é responsável, tem consciência da importância. A Assembleia ofereceu todas as condições. Já aprovou vários projetos em relação à Celg e aprovou mais um projeto agora. Se lembra quando o presidente Lula esteve em Goiás e disse que em 30 dias a situação da Celg estaria resolvida? Quanto tempo se passou (mais de um ano), mas agora de fato a coisa vai acontecer.

Quais eram os defeitos do projeto anterior?

O governo ao invés de priorizar o pagamento e tornar a Celg adimplente, conforme tinha assinado o termo de compromisso, ia priorizar o pagamento da dívida da Celg com ele. Queria receber o ICMS que tem para receber e mais essa multa que aplicaram. Não estavam preocupados em pagar a Eletrobras.

Daqui para o fim do ano, o que deve acontecer?

Esse recurso vai para o caixa da Celg e consequentemente vai para a Eletrobras. A Celg se torna viável, passa a produzir, contribui com o ICMS, devolve ao Estado e municípios recursos para gerir suas atividades. Ela vai prestar seu serviço, vai fazer a extensão rural, vai cumprir sua função social, vai ser uma prestadora de serviços.

A dívida com a Eletrobras será paga e ela ainda vai ficar com 7% da Celg e vice-diretorias. Como o sr. avalia essa situação?

É uma federalização branca. Estão federalizando a Celg. Vai ter o presidente, mas quem vai mandar são os diretores.

O governo era contra o seu parecer até o último momento, mas acabou cedendo...

O governo cedeu e votou conosco. Ele entendeu que o caminho para a salvação da Celg é esse. A única pessoa que não entendeu isso foi a deputada Betinha Tejota (PSB).


O deputado Daniel Goulart disse que o governo estaria tentando fazer uma manobra para de, alguma maneira, aproveitar politicamente a vinda desse recurso. O sr. concorda com ele?

Penso que não teria como o recurso ser utilizado na campanha política. A primeira etapa vai cair após as eleições no mês de novembro. O que acredito que ele quis dizer é que isso possa causar uma falsa expectativa de que o caixa do governo seria reforçado com recurso extra que poderia ser rateado com os correligionários. O governo federal seria o fiador desse empréstimo, mas a garantia real seria o Fundo de Participação do Estado (FPE), que ficaria comprometido para os próximos 15 anos, até inviabilizando o pagamento da folha de funcionários. Cremos inclusive que só vai sair a primeira parcela. Acredito que as outras não virão. O Estado não tem aporte dentro daqueles 16% para garantir o restante. Ou se pega esse agora e joga direto na Celg ou então fica difícil.

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