sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Lago: cuidar para desfrutar!

O Popular

A hora é de cautela

Em recente reportagem deste jornal, publicada na edição de 30 de dezembro de 2009, anunciou-se o fechamento da Barragem do João Leite, dando início à formação do lago que garantirá, até 2025, o abastecimento público de água em Goiânia e suas áreas conurbadas.

Trata-se de empreendimento de grande porte, com valor estimado em R$ 550 milhões, cuja finalidade é melhorar e ampliar os sistemas de abastecimento e esgotamento sanitário da região.

No processo de construção da barragem e do sistema João Leite – que ainda se encontra em curso –, diversos programas foram implementados pela Saneago para atender às normas ambientais vigentes e diminuir o impacto socioambiental da obra na região, mediante o monitoramento da fauna, flora, solo, população e água. Nesse processo de monitoramento, constatou-se que a situação da bacia é extremamente preocupante. Já há sinais de sua contaminação pelas mais diversas fontes poluidoras situadas ao longo do curso d’água que formará o reservatório – seja pelo uso inadequado de agrotóxicos e fertilizantes, pelo lançamento clandestino de esgotos domésticos e industriais ou pela degradação de áreas de preservação permanente.

Sabe-se que a atividade humana é um fator desencadeante e acelerador dos processos de degradação ambiental, assim como é notório que o processo de industrialização e urbanização necessita de políticas que compatibilizem o desenvolvimento econômico com a efetiva manutenção de produtividade de recursos naturais e da qualidade ambiental. Em Goiânia, conquanto disponhamos hoje de um Plano Diretor e já se encontrem elaborados os planos de manejo, o programa básico de ordenamento territorial e uso do solo, além de programas de recreação e lazer ecológico e planos de educação ambiental específicos para a região, falta ainda garantir o efetivo cumprimento e a implementação do previsto nesses documentos. Deve-se considerar que qualquer flexibilização nesses instrumentos de política pública ambiental pode comprometer o reservatório ainda em formação, dada à pressão do setor imobiliário para a instalação de empreendimentos nas proximidades da Barragem do Ribeirão João Leite.

Conforme noticiado na matéria jornalística acima citada, o projeto da barragem recebeu premiação em Congresso da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental. De acordo com as informações divulgadas pela Saneago, utilizou-se o que existe de mais avançado em termos de tecnologia de barragens na atualidade. Contudo, como é de conhecimento da própria empresa de saneamento, as condições ambientais da Bacia do João Leite estão longe do desejável e a pressão imobiliária advinda do processo de industrialização e urbanização pode colocar em risco todo o investimento já feito ou ainda por vir, comprometendo a qualidade e a quantidade de água que deveriam garantir o abastecimento de nossa população.

Não obstante se saiba que as tecnologias de tratamento hoje disponíveis possibilitam a transformação de água bruta, de qualquer qualidade, em água potável, a poluição e os custos do tratamento tendem a aumentar se a atual tendência de degradação persistir, o que, com certeza, ampliará os riscos de contaminação e acarretará o aumento da tarifa a ser paga pelo consumidor. Ademais, é comprovado que o tratamento de água pode eliminar germes e bactérias, mas há outros aspectos, como o odor e o sabor, difíceis de serem completamente tratados.

A defesa do meio ambiente é regida por princípios próprios, dentre os quais se encontram o da precaução, também denominado princípio da cautela ou da prudência, e o princípio da prevenção. A observância das normas ambientais não pode ser postergada quando houver risco de dano grave ou irreversível ao meio ambiente.

Não obstante a justificada satisfação com as reconhecidas qualidades do novo empreendimento, o momento é de redobrada cautela. Estão em jogo não apenas a efetividade do vultoso investimento incorporado na obra, mas também a qualidade e quantidade de água potável para o abastecimento da população goianiense nas próximas décadas, cuja garantia dependerá da imediata adoção de práticas ambientais conservacionistas e sustentáveis ao longo de toda a bacia – e do bom senso e comprometimento do poder público no trato da questão.

Marta Moriya Loyola é promotora de Justiça em Goiás e atua em substituição na 15ª Promotoria de Justiça em Goiânia

Nenhum comentário:

Postar um comentário