segunda-feira, 9 de agosto de 2010

CELG: terror do governo!





Opinião






Afonso Lopes


Empréstimo da Celg: o enfoque político

Começa, como já era de se esperar, um movimento visando a politização do pedido de empréstimo bilionário que o governo atual quer fazer. E o mais curioso é que isso tem sido feito com a utilização de argumentos contrários à politização do empréstimo. Na realidade, a intenção inequívoca não é evitar a politização. Ao contrário. Ela será intensamente incentivada exatamente por aqueles que se dizem contrários a ela.

Há um lobby em formação a partir dos interesses políticos do governo na aprovação imediata e às cegas desse pacotaço de endividamento sem precedentes na história de Goiás. E se tenta agora politizar ao extremo essa questão situando e classificando posicionamentos e opinião. Quem é contra a votação do jeito que está, sem detalhamento algum, sem estudos sérios de impacto futuro, sem saber ao menos a formatação desse negócio que envolve 4 bilhões de reais, estará ameaçado pela rotulagem barata da politização. Então, na outra ponta, quem defender a imediata aprovação ficará como o bom moço, aquele que é avesso à política e fervoroso adepto das causas mais elevadas e honrosas do Estado e do povo goiano.

Está aí uma claríssima politização desse assunto, absolutamente estampada, desavergonhada, sem qualquer sutileza. Politizar a discussão desse monumental empréstimo não é argumentar em torno de rótulos previamente concebidos: sim sim, não não? Se isso não é politizar a discussão é o que então?

Não me incomoda em nada admitir a politização desse empréstimo bilionário, que estenderá seus efeitos seguramente por uma geração inteira. Até por ter sido esse o caminho apresentado pelo governo para tratar do assunto. Então, ou se aceita a discussão nesses termos, ou temos que mudar nossos conceitos tupiniquins sobre o que é a política. Se ela, a política, é tão nefasta ao ponto de se tentar traduzi-la como um conjunto de conceitos contrários ao interesse da maioria, então precisamos reciclar nosso comportamento social e a forma como vivemos. Inclusive questionando a própria essência da nossa democracia, do direito à informação e opinião.

Como não abrir discussão sobre o que disse o próprio governador Alcides Rodrigues ao colocar em dúvida as intenções sobre qualquer tipo de questionamento a respeito da formatação desse empréstimo? Os deputados estaduais que expuseram alguma forma de dúvida foram rebaixados a mentirosos, adeptos de “balelas”, como foi dito pelo ainda inquilino do poder.

Logo depois, e imediatamente ao termo empregado, Alcides admitiu que existem alguns aspectos nessa negociação que “não puderam ser divulgados antes”. Serão esclarecidos, prometeu ele. Então, que se esclareçam esses pontos que se escondem sob um sigilo que não foi, nem mesmo ele, o sigilo, explicado. Genericamente, o governador limitou-se a falar que a divulgação do negócio financeiro poderia prejudicar sua viabilização. Por quê? O que existe num fabuloso empréstimo como esse que foi necessário negociar às escondidas? Por fim, Alcides refutou qualquer possibilidade de utilização político-eleitoral dessa montanha formidável de dinheiro vivo ao afirmar que há destinação única e legal para os recursos: a Celg. Dinheiro carimbado, disse ele.

Pois afirmo que, da forma como está na lei enviada à Assembleia Legislativa, não se percebe esse cuidado e prudência legal contra a utilização indevida dessa fortuna. Há, sim, a destinação total do dinheiro para a Celg. A Secretaria da Fazenda receberá R$ 1 bilhão e 721 milhões. Esse dinheiro, diz a mensagem, será usado na quitação da dívida do Estado para com a elétrica. O restante, cerca de R$ 2 bilhões, irá para a Secretaria do Planejamento, e só poderá ser usado no aumento de capital da Celgpar e suas subsidiárias. Dinheiro carimbadíssimo, é verdade.

Mas, como se sabe, a Celg não é um cofre-forte onde se coloca dinheiro, tranca a porta e se guarda a chave. Carimbado na entrada, essa fortuna toda perde o carimbo no exato momento em que for usada pela empresa, seja para pagar credores, seja ao investir na expansão de seus equipamentos. E entre os credores habilitados a receber dinheiro sem carimbo na boca do caixa da Celg está justamente a Secretaria da Fazenda. Esse é o ponto.

Há inúmeras declarações de autoridades do governo desde meados do ano passado falando abertamente sobre o que a Secretaria da Fazenda irá fazer com o dinheiro não carimbado que espera receber tão logo esse empréstimo seja viabilizado. No dia 18 de junho deste ano, o próprio Alcides Rodrigues, ao opinar sobre essa operação financeira, disse ao site Goiás Notícias (conforme relato e citação do site Acontece News), mantido pelo governo, que o empréstimo de R$ 4 bilhões para a Celg permitirá que os cofres estaduais recebam nada menos que R$ 700 milhões como ICMS não recolhido pela elétrica na data certa.

Não foi somente o governador que falou sobre esse dinheiro não carimbado que entrará nos cofres estaduais como conseqüência direta do empréstimo para a Celg. Em maio, o secretário do Planejamento, pasta que receberá e destinará R$ 2 bilhões para a Celg, falou que “capitalizado com essa reposição de ICMS, o governador Alcides Rodrigues vislumbra novos investimentos e apoios para os prefeitos”.

A politização desse empréstimo foi abordada no jornal O Popular, em junho, quando foi citado que “O governo Alcides Rodrigues (PP) prevê reforço no caixa de até R$ 500 milhões com o desfecho do socorro financeiro à Celg pelo governo Lula”. Na mesma nota, informou-se que “a expectativa no governo Alcides é de que a negociação em Brasília seja concretizada em julho e o pagamento do ICMS, via empréstimo da Celg, seja pago em agosto”.

Qual é a conclusão disso? São duas: que, tecnicamente, esse empréstimo visa, sim, socorrer financeiramente a Celg, e que, politicamente, o governo quer se aproveitar da situação para dar uma belíssima incrementada na sua capacidade de investimentos em R$ 700 milhões de reais, em dinheiro vivo e sem carimbo algum, em pleno período eleitoral.

Como se vê, há uma politização nesse empréstimo para salvar a Celg. E o que é pior, com possível viés eleitoral. Caberá ao governo, se realmente for esse o interesse, despolitizar completamente essa operação financeira. Primeiro, reduzindo os valores referentes ao encontro de contas entre o Tesouro (ICMS) e a Celg de modo a não gerar esse troco de R$ 700 milhões em dinheiro vivo e sem carimbo. Depois, e também em nome da transparência total, publicando a relação completa das dívidas e dos credores que a Celg pagará ao receber tanto dinheiro, principalmente os do setor privado, notadamente as empreiteiras.

Não existe outra forma de discutir tecnicamente esse empréstimo sem providências banais como as sugeridas. Ou se faz isso, ou que reforcem o lobby. Mas é no mínimo aconselhável melhorar alguns argumentos pró-concessão do empréstimo às cegas. Dizer, como fez um dirigente empresarial no Twitter semana passada, que se o dinheiro não vier agora viveremos sob a luz de velas é abusar da inteligência de todos.


Afonso Lopes é jornalista (Twitter: @a_fonso)

Nenhum comentário:

Postar um comentário