sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Déficit: a farsa!





Opinião

O déficit da economia goiana e o relatório da Universidade de São Paulo

Salatiel Soares Correia

Não poderia ter sido mais oportuna a contratação da consultoria da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo – Fipe-USP para esclarecer uma questão que vem sendo muito debatida no transcurso do processo político que ora se inicia: a de quais governos foram mais, ou menos responsáveis pelo déficit nas contas públicas do estado de Goiás.

Sobre esse assunto, comento a seguir alguns pontos do relatório dessa fundação, que considero relevantes e úteis para o atual momento que definirá a eleição do próximo governador. Vamos, pois, a eles.

Primeiro: Quem “quebrou” o estado:

A esse respeito, diz o relatório: “não é exatamente adequado dizer que esta ou aquela gestão endividou (quebrou) o Estado de Goiás. O adequado é dizer que esta ou aquela gestão faz parte do período/dinâmica em que o endividamento foi contido.”

Comentário meu: o relatório prova com clareza absoluta que de 1991 a 1998 o endividamento corria solto. Por essa razão é que o crescimento da dívida pública foi cada vez mais expressivo.

Porém, de 1994 em diante, foram colocadas amarras no endividamento, o que provocou sua queda, precisamente a partir de 1999. Mas, atenção: o mérito dessa queda vem de uma ação do governo Fernando Henrique Cardoso, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, que impôs restrições ao gasto irresponsável de governos predadores. Mais: o lado predador das ações de governo trouxe um perverso reflexo nas contas públicas goianas: o fato de as receitas — que originam dos investimentos produtivos — irem-se extinguindo ao longo do tempo. Com isso, os investimentos passaram a ser financiados pelas receitas correntes. Mas o que isso significa? Significa que a perda patrimonial originada do desequilíbrio econômico-financeiro de empresas estatais, como é o caso da Companhia Energética de Goiás (Celg), é que de fato vem financiando o que chamam de “investimentos” na economia goiana. E isso é grave, muito grave. É o preço que o povo de Goiás vem pagando para atender a inúmeros lobistas que jogam seu próprio jogo e não o do desenvolvimento do estado. E nesse balaio se incluem os financiadores de campanhas políticas, que depois cobram seu preço dos governos que ajudaram financeiramente a eleger.

Segundo: o mito de déficit zerado:

Sobre isso, aponta o relatório que “cabe ressaltar que a elevação do superávit financeiro em 2009 é fruto do esforço para cancelar dívidas (INSS) antigas já prescritas.”

Comentário meu: como houve cancelamento de dívidas antigas com o INSS, o superávit de 2009 é o resultado não do esforço de pagamento de dívidas, mas do cancelamento de dívidas há muito prescritas.

Terceiro: o marco venda da Usina Hidroelétrica de Cachoeira Dourada:

A respeito desse assunto, diz com precisão o relatório: “nos dois anos subsequentes há uma queda nas receitas de capital e a partir de então, as receitas correntes passam a representar praticamente a receita arrecadada do estado. Assim, além da receita de capital, a receita corrente passou a ser usada para financiar os investimentos e a redução da dívida. Nesse período de 2000 a 2009 as receitas correntes praticamente dobraram, passando de R$ 6,5 bilhões para R$ 12,5 bilhões, em termos reais.”

Comentário meu: é exatamente aí que entra o lado mais trágico da dívida. Por um lado, os sobreinvestimentos — colocados propositadamente bem acima do que era necessário (elefantes para matar pulgas) — cobraram o preço do desenvolvimento fácil num ambiente de estabilidade inflacionária. Prova disso é o peso representativo da indexação na dívida do estado de Goiás, como bem aponta o relatório da FIPE.

Por outro lado, a venda da Usina de Cachoeira Dourada e o gasto às tontas do dinheiro refletiram no pior dos mundos que Goiás passou a viver desde então: a perda patrimonial — via desequilíbrio econômico-financeiro de nossas empresas estatais — passa a financiar os investimentos. Traduzindo: isso empobreceu assustadoramente o patrimônio público goiano. Pura falta vontade política ante a pressão dos inúmeros lobbies que, como anteriormente disse, jogam seu próprio jogo e não o do desenvolvimento do estado. Não tenham a menor dúvida: é por essa razão que problemas como o vivido pela Companhia Energética de Goiás não foram de fato enfrentados.


Salatiel Soares Correia é engenheiro, bacharel em Administração de Empresas e mestre em Energia. É autor, entre outros, do livro A construção de Goiás

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