segunda-feira, 15 de março de 2010

O Popular

CIDADES

Polícia matou 224 nos últimos 8 anos em Goiânia
Confrontos foram investigados pelas polícias civil e militar, mas número pode ser maior

Rosana Melo

Dados da Polícia Civil revelam que 224 pessoas foram mortas em possíveis confrontos com policiais civis, militares e federais nos últimos oito anos em Goiânia. Na maioria dos casos, houve envolvimento de policiais militares (99%), por serem os responsáveis pelo patrulhamento ostensivo e, portanto, o primeiro a lidar no enfrentamento com suspeitos. Em apenas 1% dos casos há o envolvimento de policiais civis e federais.

É considerado confronto quando, ao abordar suspeitos, o policial revida a tiros disparados por supostos bandidos. Nesse caso, a lei determina que seja instaurado inquérito pelas corregedorias das polícias para apurar o crime de morte.

O caso é investigado e o inquérito remetido ao juiz e ao Ministério Público, que pode pedir o arquivamento quando há o entendimento de que houve o resultado morte em legítima defesa do policial ou de terceiros.

“Nesse caso, o processo contra o policial é arquivado”, explicou o gerente de apoio da Corregedoria Geral da Secretaria de Segurança Pública de Goiás, delegado José Bontempo.

Em Goiânia, os casos de confronto são investigados pela Delegacia de Homicídios e pelas corregedorias das polícias. Muitos crimes, porém, causam dúvidas aos policiais e aos peritos criminais quanto à situação de confronto.

É que até o dia 18 do mês passado havia uma norma adotada no Procedimento Operacional Padrão (POP) da Polícia Militar de que em casos de confronto, os militares deveriam socorrer as vítimas.

Com isso, os militares levavam para o Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) mesmo as vítimas que morriam no local da troca de tiros, o que impossibilitava ou prejudicava a perícia no local do crime. A partir do dia 18 do mês passado, uma nova norma, adotada mediante consulta ao Ministério Público, passou a vigorar.

Todo policial militar envolvido em confronto em que resulte a morte do suspeito deve permanecer no local do confronto até a realização da perícia.

Peritos criminais e policiais da Delegacia de Homicídios comemoraram a adoção da nova norma, que proíbe os policiais de retirar as vítimas do local do confronto.

“Com isso, a perícia pode ser feita de forma idônea”, comentou um delegado.

Segundo ele, como a história contada por militares em supostos casos de confrontos é praticamente idêntica, nem sempre havia como afirmar se realmente houve confronto ou execução sumária do suspeito.

“A PM sempre afirma que estava em patrulhamento, observou alguém em situação suspeita e, durante a abordagem, houve troca de tiros, com a morte do suspeito. Agora teremos como provar cientificamente que isso aconteceu”, contou o policial civil.

A norma adotada pela PM determina ainda que os feridos em confrontos devem ser socorridos por equipes especializadas no atendimento público de emergência – Corpo de Bombeiros e Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) –, regra que só pode ser quebrada diante da indisponibilidade do serviço na hora em que for acionado.

MORTOS PELA POLÍCIA

Os oito delegados da Delegacia de Homicídios investigam, desde o ano 2000, quando a delegacia foi reestruturada, outros casos de assassinato atribuídos a policiais em Goiânia, sem que a morte tenha ocorrido em situação de confronto.

São execuções decorrentes de problemas passionais, desentendimento em bares e por pistolagem.

Segundo inquéritos instaurados na Delegacia de Homicídios, somente em 2008 foram 32 mortes atribuídas a policiais, das quais 15 foram em situação de confronto. As outras ocorreram em situações desvinculadas da atividade policial.

No ano passado, ocorreram 27 supostos confrontos, mas pelo menos outros 10 casos são investigados tendo como autores policiais militares da ativa, atuando em grupos de elite da PM. “Mesmo em casos onde há relato de confronto, soubemos, mediante investigações, que não houve confronto e que a situação foi armada pela polícia”, contou outro delegado da Homicídios.

Uma situação dessas foi investigada pelo delegado titular da Homicídios em janeiro de 2008, quando um flanelinha de 14 anos foi morto a tiros na Vila Coronel Cosme.

O adolescente seria vigia do tráfico e teria sido morto por policiais das Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam), segundo testemunha ouvida da delegacia.


PM acusado de proteger o tráfico

Rosana Melo

Em dezembro de 2008, o soldado Rogério Moreira da Silva, de 34 anos, foi preso em cumprimento a mandado de prisão temporária acusado de três homicídios em Goiânia e de envolvimento em pelo menos outros 10 crimes de morte na capital e 19 em Aparecida de Goiânia.

Segundo o que foi coletado em depoimentos e exames periciais pela Delegacia de Homicídios e pelo Grupo de Investigações de Homicídios (GIH) de Aparecida de Goiânia, o soldado Rogério seria contratado por traficantes para executar inimigos e usuários de drogas que tinham dívidas de drogas e não pagavam.

Na época, a Polícia Civil conseguiu prova testemunhal contra soldado, conhecido entre os traficantes e usuários de drogas como Zinca. José (nome fictício), de 32 anos, deu entrevista exclusiva ao POPULAR em dezembro de 2008, e denunciou que o soldado cobrava propina de traficantes de drogas das imediações do Parque Mutirama, da Vila Nova e da invasão da Vila Coronel Cosme.

Em troca do dinheiro, entre R$ 1,8 mil a R$ 3 mil por semana, o soldado garantiria que a Polícia Militar não atuasse na região coibindo o tráfico de drogas. A investigação contra ele ainda segue na Justiça. (R.M.)

Sumiço de Camila Lagares foi após troca de tiros

Rosana Melo

No dia 8 de abril completa-se um ano do desaparecimento da estudante Camila Lagares Pires, de 18 anos. Ela foi vista pela última vez no dia 7 de abril, quando saiu de casa, no Setor União, para ver o namorado em um hospital.

De lá, ela e um amigo do namorado teriam ido para uma casa no Setor Centerville, onde policiais militares trocaram tiros com os três rapazes que estavam na casa.

Morreram Wilton de Sousa Peixoto, de 23, Camilo Fernandes da Silva e Jhones Martins de Castro, ambos de 22. A jovem, que estaria com Camilo, nunca mais foi vista e a família dela acredita que Camila tenha sido uma vítima da própria polícia, por estar no lugar errado e na hora errada.

Wilton, segundo as investigações, era acusado dos assassinatos do soldado da PM Eduardo Toledo Santiago e do agente prisional Rafael Rodrigues Trindade, ambos de 26, crimes ocorridos no dia 23 de dezembro de 2008, no Setor Bela Vista.

O pai da estudante, o analista de sistemas José Luiz Pitta Pires, reclama que o desaparecimento da filha é investigado apenas pela Divisão de Pessoas Desaparecidas (DPD) da Delegacia de Homicídios.

Segundo ele, a única linha de investigação é a de que ela teria sido morta pelos militares também. Nada até hoje foi provado.

Segundo José Pitta, o sofrimento da família é muito grande, principalmente pelo fato de não ter qualquer notícia sobre o paradeiro da filha. “Não sei nem se ela foi morta”, disse. (R.M.)

Delegacia liga militar a triplo homicídio

Rosana Melo

A Delegacia de Investigações de Homicídios investiga a participação de um policial militar na execução do casal Valmecir Francisco da Silva e Nísia Moslova Segato, ambos de 26 anos, ocorrida na noite de 7 de março deste ano, na Avenida Contorno, no Conjunto Anhanguera.

Minutos após a morte do casal, uma testemunha do crime que havia reconhecido o militar e repassado a informação para a polícia, foi morta na mesma avenida, mas no Parque Santa Cruz.

Alex Coelho da Conceição, de 37, foi executado com vários tiros quando transitava de motocicleta pela avenida, depois de afirmar, na primeira cena de crime, que havia identificado o militar.

O nome dele foi omitido para não atrapalhar as investigações. De acordo com a Polícia Civil, Valmecir e Nísia tinham passagem na polícia por roubo e homicídio e a morte deles pode estar relacionada a vingança. A morte de Alex, todavia, seria queima de arquivo, já que ele conhecia o executor do duplo assassinato.

Flagrante

De acordo com os delegados da Delegacia de Homicídios, vítimas de confronto com a polícia sempre estão em situação de flagrante de algum crime, armados e revidam a ação policial para evitar a prisão. Em casos de execução, as vítimas geralmente tinham antecedentes criminais e foram mortas em acertos, o que pode ter sido o caso da semana passada. (R.M.)

ANÁLISE

Mortes geram promoção

Considerado ato de heroísmo, o assassinato de suspeitos de crimes é premiado com promoções pela Polícia Militar, apesar de autoridades negarem a ligação entre causa e efeito. A política de “bandido bom é bandido morto” não pode ser estabelecida. O correto seria prender o bandido, como diz a lei.

Certo é que em casos extremos, quando não há possibilidade de efetuar a prisão do bandido, o policial, trabalhador que garante a segurança da sociedade, se defenda da agressão. Neste caso, merece a promoção. Não pela morte do bandido, mas pela bravura no enfrentamento com o crime.

Na semana passada, a Assembleia Legislativa aprovou moção de aplauso a policiais das Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) “pela ação eficiente que culminou na morte de três integrantes de uma quadrilha de assaltantes”. A moção foi aprovada pela bravura dos militares em ação contra a marginalidade ou pelas três mortes resultantes da ação? O documento aprovado pelos deputados não esclarece a questão. (R.M.)

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