segunda-feira, 16 de agosto de 2010

CONEXÃO






DILMA NA FRENTE






Afonso Lopes


E agora, Serra?
Não foi tão simples quanto parece, mas Lula conseguiu empurrar Dilma Roussef para a ponta nas pesquisas. Serra ainda tem chances?

O jogo foi duríssimo. Num país com leis um pouco mais severas e culturalmente menos tolerante com o tal jeitinho, fatalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) poderia ter se exposto diante de um pelotão judicial que encerraria seu mandato precocemente. Lula foi muito além do mais basilar conceito ético para promover a candidatura à Presidência da República da ex-ministra Dilma Roussef. Ele ultrapassou todos os limites da dignidade que o cargo exige. Mas e daí? Outro, no mesmo lugar em que ele está, fez coisas semelhantes para bisar mandato. Lula, portanto, não foi o primeiro, e infelizmente não será o último, a pisotear a legislação para tentar manter o poder.


E Dilma? A Dilma é um desses postes da política, sem dúvida nenhuma. Fosse ela ainda do PDT, como no início de sua carreira, passaria completamente despercebida numa campanha presidencial. Talvez, e se contasse com estrutura arrasa-quarteirão, poderia no máximo se candidatar a deputada federal. Nem ao Senado teria muitas chances. Carisma zero.

Mas ela não é líder das pesquisas apenas por causa de Lula e da militância aguerrida do PT. Dilma Roussef é inteligente. Não tem nada de boba. Sabe conversar, tenta pelo menos ser charmosa e se esforça. E bota esforço nisso. Ela conseguiu sair do PDT, partido fundado por Leonel Brizola que rivalizou com o PT o monopólio da esquerda durante os primórdios dos dois partidos, e ganhou todas as posições possíveis. Ao ponto de ser ela hoje a herdeira do lulismo, algo absolutamente impensável antes.

Vá lá que seus rivais foram caindo como moscas pelo caminho. O príncipe do PT, José Dirceu, foi obrigado a se esconder nas madrugadas para frequentar a corte após o bombardeio do mensalão. Ele mantém uma influência enorme dentro do PT, mas seria facilmente abatido numa campanha presidencial contra o PSDB. Seu substituto imediato no reino petista, Antonio Palocci, também se perdeu em meio a extratos bancários de um pobre jardineiro. Outros históricos do PT, como Aloizio Mercadante, não conseguiram avançar no vácuo dessas quedas. Aí surgiu a Dilma do Lula.

Méritos dela, sem nenhuma dúvida. A dama de ferro e de um humor terrível aceitou se tornar menos amarga. Não doce demais, mas pelo menos um pouco mais fácil. De técnica passou a ser também política. Tão política que está onde está apesar da origem brizolista.

E, como Lula, também se dobrou aos conceitos de imagem. Até plástica fez para amenizar alguns traços. Se o velho operário topou se vestir com ternos Armani, a dama de ferro encarou o espelho e se tornou um pouco mais vaidosa. Anda toda-toda com seus terninhos bem cortados e tenta sorrir a cada instante. Nem sempre consegue, é verdade. Afinal, ela é de ferro.

Já o PSDB vive um drama sem tamanho. No conflito entre o príncipe dos sociólogos, Fernando Henrique Cardoso, e o rei dos operários, Lula levou vantagem. Muita vantagem. Se fosse possível colocar a ambos numa disputa direta em seus melhores momentos, o petista ganharia no primeiro turno. FHC jamais esteve perto da popularidade que Lula atingiu. Ponto para o padrinho de Dilma.

José Serra é um dos melhores homens públicos do Brasil. Competente, experiente, e comprovadamente eficiente e criativo. E daí? Daí que ele é também carrancudo pra caramba. Em São Paulo, contra Maluf e Marta Suplicy, as virtudes foram suficientes para estabelecer uma espécie de reinado dos tucanos. No confronto com Lula no sertão nordestino a coisa é bem diferente. Mais uma vez, ponto para Dilma e seu padrinho.

O PSDB tinha duas opções: Serra ou o mineiro boa praça Aécio Neves. Internamente, Aécio não deu nem para o cheiro. Perdeu a corrida para o paulista. Externamente, caso se confirme a tendência atual de vitória de Dilma Roussef, é bem provável que a discussão sobre o que aconteceria caso Aécio e não Serra fosse o candidato à Presidência da República avançará durante anos e anos.

É obviamente um negócio sem ponto de encontro discutir se Aécio Neves seria um candidato mais viável do que José Serra. Em alguns aspectos sim, em outros, flagrantemente, não. O mineiro é muito mais amável, acessível e simpático que o paulista. Mas sempre foi Serra que demonstrou na pré-campanha ter mais condições de disputar o cargo do que Aécio. Enquanto o mineiro era de Minas, Serra já estava no Brasil.

Mas, espere um pouco: não se está aqui falando que a eleição está definida e que Dilma Roussef será a vencedora. A diferença entre eles não é tão grande assim, e provavelmente haverá segundo turno. Além disso, Serra tem muito mais o que mostrar dele próprio do que Dilma dela mesma. Há uma diferença de conteúdo brutal entre eles, com nítida vantagem para o tucano. O problema é que eleição rima com emoção e não com razão. E quando o assunto é emoção, o padrinho de Dilma ganha mais um ponto.

Por aquilo que está se vendo e ouvindo neste momento, o PSDB deve bater na tecla de que Dilma não é Lula, e que o padrinho dela não estará por perto depois da eleição. É realmente uma tese verdadeira, que faz sentido. A era Lula está acabando. Pelo menos, a atual era Lula — sabe-se lá se o homem não pega gosto depois por um retorno. Mas essa tese é baseada no campo da racionalidade. É muito difícil que isso dê algum resultado positivo para Serra na eleição.

Pelo menos por aqui isso nunca deu em nada. E olha que foram duas tentativas. A primeira em 1994. O atual deputado federal Ronaldo Caiado dizia que seu adversário, Maguito Vilela, não tinha luz própria, e que usava a identidade de seu padrinho, Iris Rezende Machado. Maguito foi eleito e Caiado não chegou ao segundo turno. Mais recentemente, em 2006, foi Maguito quem usou a figura da falta de luz própria para tentar neutralizar os holofotes com que Marconi Perillo iluminava a candidatura de Alcides Rodrigues. Como se sabe, Alcides venceu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário