Edilson Pelikano/Jornal Opção
Marconi Perillo sofreu um bombardeio, mas manteve praticamente intacta sua imagem
MARCONI PERILLO
Pairando acima da onda
Acontecimentos provocados ou não por ações diretas do senador melhoram as condições de sua pré-candidatura ao governo. Mas o destino não tolera desaforos
Nada melhor que uma frase do futebol para explicar o momento político-eleitoral vivido pelo senador Marconi Perillo, virtual candidato ao governo de Goiás: “Goleiro bom também precisa ter sorte”. Isso diz tudo sobre a fase atual do líder tucano. Seja por suas ações, seja por conflitos e indecisões de adversários sobre os quais não tem praticamente nenhuma participação direta, tudo vai favorecendo cada vez mais para a candidatura dele ao Palácio das Esmeraldas. É como se houvesse uma conspiração do destino.
Marconi tem feito a parte dele para dar uma mãozinha ao “destino”. Sua capacidade de deslocamento e de enfrentar maratonas intermináveis de encontros com lideranças e com grupos da população é extraordinária. Não há nenhum paralelo na história de Goiás sobre um político tão, digamos, andarilho como ele. O que chega ao grande público através dos jornais sobre isso é somente a cobertura jornalística do maior evento do dia, e não o único. Se fossem incluir as visitas para fulano, para o morador da cidade tal ou as várias reuniões com 10, 20 ou 30 pessoas que ele faz diariamente os jornais não falariam de outra coisa. O que é publicado é somente o grande evento, com grupos de 200, 300 participantes.
O que resulta daí? É o que se vê e percebe. Por mais que ele tenha passado por severos constrangimentos provocados por insistentes, massivos e permanentes ataques, sua imagem permanece, conforme atestam todas as pesquisas neste momento, absolutamente inabalável e no alto.
Não foi por falta de empenho dos adversários que Marconi conseguiu passar pelas tormentas praticamente inteiro, com exceção de um ou outro arranhão superficial. Talvez jamais tenha se visto em Goiás uma ação tão extraordinariamente forte contra um político como a que ele enfrentou ao longo dos últimos três anos. Não que eu me recorde, e olha que tenho acompanhado de perto e profissionalmente todas as eleições de Goiás desde o retorno da eleição direta para governadores, no início da década de 1980.
Em determinados instantes dessa estratégia de desconstrução de Marconi junto ao povo de Goiás, cheguei a imaginar que seria absolutamente impossível para ele se manter positivamente no imaginário coletivo. Isso por causa da variedade, intensidade e constância desses ataques. Além do fato, que sempre conta muito, de que as críticas e acusações não partiram da trincheira adversária, o que fatalmente pagaria o preço do antagonismo previamente conhecido enquanto credibilidade. Não, os ataques foram daqueles que eram seus aliados.
Não são necessárias explicações extras para se entender melhor e de forma mais clara porque o ataque de um amigo causa mais estragos — ou deveria ter causado, no caso de Marconi — do que o de um inimigo declarado. Ora, para o receptor dessas acusações, a população, sempre se leva em conta que o inimigo ataca porque é da sua essência. Quando esse mesmo ataque parte de um amigo, a coisa ganha dimensão. De início, até que o receptor o veja como novo adversário, ele goza de certa credibilidade.
É por isso que em determinados momentos suspeitei que Marconi desceria à vala dos comuns sem essa aura vitoriosa que ele e outros poucos políticos goianos conseguem exibir. Mas essa fase está absolutamente superada. Há cerca de um ano, aqui mesmo nesta Conexão, eu dizia que o estoque de bombas dos novos adversários de Marconi tinha acabado, e que ele havia sobrevivido. O que se percebe neste momento é exatamente isso.
Era previsível, diga-se, que as armas de ataque perdessem eficácia. Primeiro porque a condição sine qua non da amizade desapareceu completamente. Ou seja, a partir de determinado momento, a população/receptor passou a perceber que os atacantes não eram amigos, mas ex-amigos, agora transformados em novos adversários. A credibilidade do ataque, portanto, ficou a cada dia muito menor até não restar mais nada, pelo menos enquanto “fogo amigo”.
Por outro lado, além da constância dos ataques, a insistente generalização de todos os males administrativos atuais creditados a Marconi e seus dois governos provocou um efeito saturação. O exagero desses ataques acabou com a estratégia. Marconi foi apontado como origem de tudo o que não está ou não esteve bem. Dos buracos nas estradas causados pelas temporadas de chuvas ao abandono de obras, tudo foi embalado como bomba de ataque a ele.
É muito fácil perceber agora que os ataques contra Marconi já não surtem efeito algum. Basta uma mera e quase desatenta pesquisa sobre as manchetes dos jornais antes e atualmente para constatar que as críticas perderam o efeito da novidade, o impacto. Virou briga de comadres, tão comum na política quanto urnas e votos.
E olha que o PSDB, enquanto partido, nem foi tão competente assim para criar uma capa protetora para sua principal liderança. Ao contrário, ficou no lusco-fusco de reclamações sobre um tal de patrimônio político de Marconi, algo vago que a população/receptor não tem sequer tempo para enumerar em suas mais vãs preocupações. O que mexeu no conjunto da credibilidade das críticas foi o questionamento sério, pontuado e determinado sobre as causas dos ataques, sua consistência, incoerências e objetivos.
De toda forma, é inegável que a espetacular imagem pública de Marconi Perillo, construída em duas administrações que permanecem como referência para a esmagadora maioria da população, foi decisiva para a superação dos momentos mais agudos de bombardeio massivo. Fosse ela uma imagem tosca, construída, sedimentada e alicerçada somente no marketing (que, aliás, foi tema de uma das formas de ataque contra ele), certamente os adversários de Marconi estariam hoje comemorando. Se não sua destruição completa, pelo menos um sério abalo.
Nos bastidores, é intenso o comentário sobre uma campanha eleitoral fortemente baseada em novos ataques contra Marconi. Seria essa uma boa estratégia, com alguma chance real e palpável de sucesso? Sabe-se lá. Pelo histórico, não. Se em três anos não se conseguiu muita coisa, difícil imaginar que três meses mudem tudo.
Para se ter estabelecer uma melhor dimensão sobre a presença permanente e inteira (exceção para os arranhões superficiais, repita-se) de Marconi no consciente coletivo dos goianos, bastaria um quadro rapidamente comparativo com todas as sete eleições para governador desde a redemocratização do País.
Em 1982, sob uma onda que varria os últimos resquícios da ditadura no Brasil, Iris Rezende liderou a maior frente oposicionista já montada até hoje. Ele não tinha apoio de nenhum dos três palácios, do Planalto, das Esmeraldas e das Campinas (depois transferido para o Palácio do Cerrado Venerando de Freitas). Em compensação, seu adversário, Otávio Lage, também não, embora fosse do mesmo partido do governador Ary Valadão e do prefeito Índio do Brasil Artiaga (substituído durante a campanha eleitoral por Goianésio Ferreira Lucas).
Em 1986, O então senador Henrique Santillo venceu as eleições. Ele tinha decisivo apoio do Palácio do Planalto, governo de José Sarney, do Plano Cruzado (primeira grande tentativa brasileira de controle da inflação), que encheu os governistas de votos de norte a sul do País, além dos Palácios das Esmeraldas, sob comando do ex-vice-governador de Iris Rezende, Onofre Quinan (Iris deixou o cargo para assumir o Ministério da Agricultura, em Brasília), e das Campinas, que tinha Daniel Antônio (na época, filiado ao PMDB).
Em 1990, Iris Rezende foi eleito na contramão dos desejos do Palácio das Esmeraldas, mas tinha a Prefeitura de Goiânia, sob o comando de Nion Albernaz (filiado ao PMDB naquele tempo e integrante do grupo irista). O Palácio do Planalto estava com Fernando Collor, com clara preferência pelo atual DEM e seus aliados. Em Goiás, naquela eleição, esse segmento era representado pela candidatura do ex-prefeito de Rio Verde Paulo Roberto Cunha.
Na eleição de 1994, Maguito Vilela teve total apoio de Iris e do Palácio das Esmeraldas, e, no segundo turno, somou também o prefeito de Goiânia, Darci Accorsi. O Palácio do Planalto tinha à frente o ex-vice de Fernando Collor, o peemedebista Itamar Franco, que se pautou pela neutralidade, pelo menos quanto às eleições em Goiás.
Em 1998, Marconi ganhou com apoio da Prefeitura de Goiânia (prefeito Nion Albernaz) e do Palácio do Planalto (presidente Fernando Henrique). O Palácio das Esmeraldas, nas eleições, foi comandado pelo ex-vice-governador Naphtali Alves (hoje conselheiro do TCE). Depois das eleições, o mandato foi concluído pelo então presidente da Assembléia Legislativa, Helenês Cândido, com a ida de Naphtali para o tribunal de contas.
Em 2002, Marconi foi reeleito. Desnecessário dizer que ele contou com todas as vantagens de suceder a ele próprio por capitanear um governo com boa aprovação. Fechou as eleições no primeiro turno. Foi oposição a ele o Palácio do Cerrado, prefeito Pedro Wilson, mas teve apoio do Palácio do Planalto, com o presidente Fernando Henrique.
Finalmente, em 2006, Alcides Rodrigues foi reeleito graças ao mais impressionante recall de imagem dos governos Marconi, dos quais era vice-governador. Ganhou bem, de virada, apesar do empenho contrário do Palácio do Planalto, com Lula, e da Prefeitura de Goiânia, sob comando de Iris.
Muito bem, e o que se pode tirar disso tudo que aí está e que se constitui em fato histórico, embora resumido? É a primeira vez que um candidato com enorme possibilidade de vencer as eleições para governador em Goiás lidera todas as pesquisas de intenção de voto de forma consistente e sem ter um único Palácio a empurrá-lo artificialmente para o alto.
O que é isso? Uma permanente e fortíssima imagem positiva construída em dois governos e alimentada grão por grão, reunião por reunião, encontro por encontro, visita a visita. Também por isso é que os adversários que antes batiam nele agora batem cabeça, sem ação, sem foco e sem nenhum resultado prático até aqui. Parece mesmo ser uma grande conspiração do destino.
Isso significa que a eleição deste ano será uma formalidade? Longe disso. Aliás, muito longe disso. O destino não tolera desaforos. Vide 1998.
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