sexta-feira, 21 de maio de 2010

Ficha polêmica







POLÍTICA

SUCESSÃO
                                  Foto: U. Dettmar/STF - 20/05/10
Lewandowski: “O povo brasileiro estará bem melhor representado no próximo ano”


TSE decidirá aplicação do Ficha Limpa
Levantamento do tre de Goiás aponta que 13 políticos ficam inelegíveis se lei valer para este ano

Núbia Lôbo

Aprovado pelo Congresso como remédio contra a corrupção na política, o projeto do Ficha Limpa não deve alterar o perfil das candidaturas deste ano. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, jogou um balde de água fria na euforia dos que esperavam que a lei enquadrasse os candidatos já condenados. O ministro disse que só poderá ser aplicada contra pessoas condenadas no intervalo de tempo entre a sanção da lei pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o registro das candidaturas.

Como Lula tem até 15 dias para confirmar ou não o texto do projeto – ou seja, 3 de junho –, dificilmente algum candidato será enquadrado nas novas regras. O prazo para o registro das candidaturas na Justiça Eleitoral vai de 10 de junho a 5 de julho.

Em Goiás, segundo levantamento do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-GO), existem 13 políticos com a ficha suja que estariam impedidos de registrar candidatura caso a lei seja aplicada para as eleições deste ano. São prefeitos, vice-prefeitos, deputados estaduais e federais, além de suplentes, que tiveram mandato cassado pelo tribunal em razão de captação ilícita de sufrágio (compra de voto) e gasto ilícito em campanha.

No entendimento da Procuradoria Eleitoral de Goiás, estariam inelegíveis pelo projeto do Ficha Limpa o deputado federal Ênio Tatico (PRP), os deputados estaduais Valdir Bastos (PR), Marlúcio Pereira (PTB) e Betinha Tejota (PSB), todos pré-candidatos a reeleição. A ex-prefeita e atual vereadora de Caldas Novas Magda Mofatto (PTB), pré-candidata a deputada federal, também está na lista de condenações do TRE.

O Ficha Limpa enquadraria ainda o suplente de deputado federal Chico Abreu (PR), que exerceu o mandato na vaga de Roberto Balestra (PP) por diversas vezes nos últimos três anos. Outro deputado estadual que ficaria inelegível com o projeto Ficha Limpa, mas por condenação no Tribunal Superior Eleitoral, é José Nelto (PMDB).

O procurador eleitoral em Goiás Alexandre Moreira Tavares destaca que ainda está estudando o texto aprovado pelo Senado, mas que em uma primeira avaliação entende que o próprio projeto de lei enquadra as condenações anteriores à sanção do projeto pelo presidente Lula. A interpretação é a mesma do senador Demóstenes Torres (DEM), relator do projeto na Casa (leia reportagem nesta página).

Segundo Lewandowski, uma lei não pode retroagir para prejudicar ninguém. Por outro lado, a Justiça Eleitoral costuma considerar, em seus julgamentos, a situação da pessoa apenas na data do registro para examinar a validade dele – ou seja, condenações posteriores não seriam levadas em consideração. “A lei só pode retroagir para beneficiar alguém, nunca pode prejudicar”, disse o ministro.

Lewandowski, entretanto, elogiou a aprovação do projeto. Para o ministro, a medida vai melhorar a qualidade da política brasileira. Como consequência, ele considera que, “o povo brasileiro estará bem melhor representado” no próximo ano, se a lei for aplicada nas eleições de outubro.

“(A lei) prestigiou o princípio da moralidade. Essa lei foi aprovada em um momento extremamente oportuno, porque permite que se possa fazer a melhor escolha possível. Os partidos políticos estão na obrigação moral de escolher os melhores candidatos, porque essa foi a manifestação praticamente unânime do Congresso, que representa a voz do povo”, avaliou.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também comemorou a nova regra e defendeu a aplicação nas eleições deste ano. Já existem duas consultas registradas no TSE questionando se a lei poderia ser aplicada neste ano. Lewandowski afirmou que a dúvida será respondida em breve, antes do prazo para o registro das candidaturas.

“Acho (a lei) extremamente relevante, extremamente importante. O Legislativo demonstrou sensibilidade para algo que indiscutivelmente é um grande anseio da sociedade brasileira. A posição do Ministério Público será no sentido de dar máxima efetividade, ou seja, exigir o cumprimento já a partir deste ano”, afirmou o procurador. (Com Agência O Globo)


Senador vê sustentação para lei

Núbia Lôbo

É no artigo terceiro do projeto de lei do Ficha Limpa que o senador Demóstenes Torres (DEM) e o procurador eleitoral em Goiás, Alexandre Moreira Tavares, encontram fundamento para estender os casos de inelegibilidade aos políticos que foram condenados por um colegiado de juízes antes da lei ser sancionada.

O artigo diz que “os recursos interpostos antes da vigência desta Lei Complementar poderão ser aditados (complementados) para o fim a que se refere o caput do artigo 26-C (...)”. Este artigo remete aos casos de inelegibilidade apontados no Ficha Limpa e acrescenta que os pretensos candidatos ficha sujas podem obter liminar para registrar candidatura.

“Se não fosse para a lei ter aplicação imediata, não precisava desse artigo no projeto”, avalia o procurador eleitoral. “A emenda do (senador Francisco) Dornelles (PP-RJ) não muda nada. O artigo 3º enquadra processos que estão em andamento”, afirma Demóstenes.

O senador esclarece que a lei – quando sancionada – não se aplica apenas aos processos transitados em julgado e com condenação definitiva. “Aí sim seria retroagir a lei”, pondera.

Sobre a possibilidade de um político ficha suja obter liminar para se candidatar, Demóstenes acredita que isso não vai amenizar a aplicação da lei. “Hoje, o efeito suspensivo da inelegibilidade é automático. Com a lei, será preciso entrar com o pedido de liminar e o tribunal terá de entender que há plausibilidade”. (N.L.)


Procurador afirma que impugnará candidaturas já no pleito deste ano

Núbia Lôbo

O procurador eleitoral em Goiás Alexandre Tavares diz que pretende impugnar o registro de candidaturas para o pleito deste ano de políticos que estiverem enquadrados nos casos de inelegibilidade previstos pelo projeto do Ficha Limpa, caso ele seja sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva até dia 10 de junho. Pelo menos 14 possíveis candidatos estão nesta situação no Estado.

Alexandre entende que não há retração da lei para os casos de condenações anteriores à sua sanção, já que as condições de elegibilidade de cada candidato são aferidas somente no momento do registro de candidatura. “É como se aprovassem uma lei aumentando a idade mínima para o presidente da República assumir o cargo. Ele precisa ter essa idade mínima no ato de sua posse, não na sanção da lei”, compara.

O professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Luiz Tarcísio Ferreira enxerga três casos que impedem a aplicação da lei nestas eleições – e até a sua constitucionalidade. Uma é o calendário eleitoral que já está em andamento, outra é o fato de que pode valer apenas para condenações posteriores e a terceira é que o Ficha Limpa estaria ferindo o princípio constitucional da presunção de inocência, o que voltaria a dar inelegibilidade apenas para os políticos condenados em definitivo.

Das três questões, Tarcísio destaca o andamento do calendário eleitoral: “Suponhamos que o ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves tivesse uma condenação nos moldes que prevê o projeto Ficha Limpa com inelegibilidade de oito anos. Ele já deixou o cargo no governo com a pretensão de disputar as eleições deste ano. Não seria razoável que ele estivesse impedido de se candidatar, isso fere a segurança jurídica do País”.

Para Alexandre Tavares, a argumentação não procede. Sobre a possibilidade do projeto ser inconstitucional, como afirma o professor da PUC-SP, o procurador eleitoral também discorda: “Entendo que essa lei, caso sancionada, se trata de uma causa de inelegibilidade, não de uma sanção ou uma pena”.

“Da mesma forma que uma empresa privada afere a vida pregressa do candidato a um emprego, uma condenação por um colegiado de juízes é um fato relevante na vida pregressa de um político que quer exercer cargos públicos de grande importância e influência na vida da população”, avalia Alexandre.

O procurador ressalta o avanço do projeto Ficha Limpa não somente nos casos de inelegibilidade criados por ele como também na ampliação de outros já vigentes. Para o abuso de poder econômico, por exemplo, a legislação prevê apenas três anos de inelegibilidade. “O que é inóquo, porque o prazo acaba antes das eleições seguintes”. (N.L.)


Emenda provoca divisão entre Câmara e Senado

AE

Brasília – À espera de ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a lei conhecida como Ficha Limpa, que dificulta a candidatura de políticos condenados por órgão colegiado da Justiça, transformou-se em alvo de controvérsia entre a Câmara e o Senado. O projeto foi aprovado e enviado na quarta-feira à noite em tempo recorde para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A polêmica em torno do projeto surgiu depois da aprovação de emenda do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que trocou em cinco dispositivos da lei a expressão “tenham sido” por “os que forem”. Essa alteração deixou claro que os políticos condenados e que já cumpriram suas penas não serão atingidos pelas novas regras de inelegibilidade.

Para o relator do projeto na Câmara, deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), essa mudança alterou o teor da lei, criando-se uma brecha para que os políticos com processos em andamento possam se candidatar, mesmo que já tenham sido condenados. “Isso vai dar uma discussão jurídica grande em relação aos processos em curso”, observou Cardozo. “Houve mudança de mérito”, emendou o deputado Flávio Dino (PC do B-MA). (AE)

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