sexta-feira, 14 de maio de 2010

Ficha Limpa






DA REDAÇÃO

Votar na leve esperança

Cícero, o orador romano, afirmou que certas coisas são precedidas de certos sinais. Quem sabe coisas como a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do texto básico do Projeto Ficha Limpa, sem alterações, deixando o Senado com a obrigação de fazer o mesmo, venham a ser indícios de que a opinião pública mais vigilante e exigente acompanha a evolução do eleitor brasileiro e que ele vai saber usar o voto contra os indesejáveis e os corruptos.

Enquanto ondas de corrupção chocam-se contra o rochedo da moral brasileira, vale a pena refletir a respeito de uma frase do costa-riquenho Oscar Arias, Prêmio Nobel da Paz: “A corrupção política é um dos maiores desafios à democracia, pois leva a maioria das pessoas a se desiludir com o governo e as eleições formais. Corruptos e corruptores são como terrível vírus sugando a saúde da democracia.”

Nos países latino-americanos, de modo geral, pode-se dizer que estamos a caminho da vitória na batalha contra as ditaduras e o autoritarismo, mas a guerra contra a pobreza e contra a corrupção ainda está longe de ser vencida. E só será vencida se a esperança de eleições positivas e de votos judiciosos e de qualidade constituam, finalmente, realidade.

Perde-se também a guerra contra todas as formas de corrupção, pois quando se supõe que estejam fechados os canais para a prática da fraude, dos crimes de colarinho-branco, dos desvios de verbas e do tráfico de influência, eis que se abrem outras comportas para saques ainda maiores e roubalheiras ainda mais pesadas. São novos, surpreendentes e irreprimíveis ataques dos esbulhadores contra o povo espoliado. A democracia está em vigor, mas ao mesmo tempo atingida por esta sucessão de golpes que a um determinado prazo só pode lhe ser funesta.

O fortalecimento das instituições é um fator indispensável para a maior eficiência dos mecanismos de combate à corrupção, mas ao lado disso é preciso colocar a modernização dos códigos, a fim de que as formas de coibir o crime econômico e administrativo não continuem defasadas diante da natureza mutável das novas modalidades de transgressão e de desonestidade.

Empresários e governantes íntegros precisam se unir para combater a corrupção, ao mesmo tempo em que dar o bom exemplo. Eles assim fazendo podem ajudar muito na criação de uma mentalidade que valorize as condutas morais, em vez de valorizar aquelas formas de esperteza que se confundem com a própria corrupção.

O objetivo de fortalecimento das instituições é indissociável da boa capacidade de julgamento dos eleitores, quando vão escolher seus representantes e outorgar-lhes poder. Quando os partidos políticos selecionarem melhor também as suas chapas, o eleitor terá margem de erro menor. De modo que esta responsabilidade dos partidos, hoje mal exercida de modo geral, torna-se um objetivo importante também para a evolução dos costumes político-administrativos brasileiros. Está se aproximando o momento das convenções e, como estas costumam apenas cumprir a formalidade, não se preocupando com em crivar os nomes colocados nas chapas, seria hora de um trabalho minucioso e exigente dos responsáveis pela montagem das chapas.

Quem sabe podemos levantar também a esperança de que os dirigentes dos partidos venham a ser escolhidos sob critérios mais rigorosos. Como pode haver algo tão intrigante como alguém cassado por falta de idoneidade continuando a presidir partido político, como ainda acontece no Brasil?

O poeta santista Vicente de Carvalho escreveu que “só a leve esperança em toda a vida compensa a pena de viver, mais nada.” Vamos nos agarrar portanto à leve esperança de que, pelo menos, não estejamos mais condenados a retrocessos no processo político do País.

Hélio Rocha é colunista do POPULAR

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