terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O Popular - 28 de janeiro de 2010

O Popular

Dramas do lixo e da água

Autoridades do setor da limpeza urbana mostram-se impressionadas com o aumento do volume do lixo produzido em Goiânia no mês de dezembro: 41,2 mil toneladas, mais de 4 mil toneladas acima da média habitual, segundo texto de Maria José Silva neste jornal (11/1). Isso corresponde a cerca de 1,14 quilo por habitante/dia. E, no ano de 2009 mais de 420 mil toneladas foram depositadas no aterro da capital, que, embora tenha menos de 20 anos e área de 260 mil metros quadrados (quase 5,5 alqueires goianos), já está próximo do esgotamento e exigirá ampliação de 200 mil metros quadrados em área vizinha. Não se tem ideia de quanto custará a ampliação. E não há alternativas à vista, já que as seis cooperativas de catadores de lixo, às quais a Comurg pretende destinar 60 toneladas mensais da coleta seletiva (menos de 0,0015% do lixo total goianiense), dizem não ter capacidade para tanto.

Numa cidade como São Paulo, calcula-se que um aterro para receber 2 mil toneladas diárias custe R$ 525 milhões, segundo a Fundação Getúlio Vargas (O Estado de S. Paulo, 7/10/09). Ali na capital paulista 14 mil toneladas diárias de lixo domiciliar e comercial estão sendo levadas provisoriamente para Osasco e Caieiras, pois ainda não foi aprovado projeto para novo aterro, após o esgotamento do São João e dos Bandeirantes. E uma das alternativas em cogitação - usinas de incineração - custa R$ 250 milhões para queimar mil toneladas diárias (sem falar em riscos da incineração). Ao todo, o sistema de coleta e destinação do lixo em São Paulo custa hoje R$ 900 milhões anuais à prefeitura.

E o caso paulistano não é único, como já se comentou neste espaço. Curitiba, tida como cidade exemplar em matéria de política do lixo, esgotou seu aterro e ainda não tem nova solução. Belo Horizonte manda seu lixo para dezenas de quilômetros de distância, em outro município, a custos altíssimos. O Rio de Janeiro está vendo esgotarem-se suas possibilidades na Baixada Fluminense e em Niterói, para onde manda seus resíduos. Recife, Belém e outras capitais enfrentam o mesmo problema. E veem pela frente ameaças como as de Nova York, que também deixou esgotar-se seu aterro de Fresh Kills e passou a mandar 12 mil toneladas/dia para mais de 500 quilômetros de distância, em caminhões, ao custo total de 60 dólares por tonelada - ou 720 mil dólares por dia. Toronto, no Canadá, em igual situação, teve de criar um comboio ferroviário que todos os dias leva seu lixo para 800 quilômetros além, onde é depositado no fundo de antiga mina de ferro.

E ainda há outros ângulos graves da questão, inclusive em Goiânia: o despejo de lixo em rios e córregos que cortam a área urbana. Segundo a Agência Brasil (28/9/9), 45,83% dos moradores da região do Rio Pavuna/Meriti (RJ) disseram em pesquisa que quase 85% deles colocam seu lixo em locais inapropriados, principalmente no leito do rio. Em seis meses foram retiradas ao longo de 20 quilômetros do rio 4.387 toneladas de lixo. Não é um panorama muito diferente do observado em quase todas as cidades brasileiras. Diz a Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, do Ministério das Cidades (28/12/09), que a maior parte do lixo em 418 municípios pesquisados (0,97 quilo por habitante/dia) vai para lixões.

Na capital paulista, a empresa de saneamento informou há poucos dias (12/1) que só no mês de dezembro retirou 11 toneladas de lixo da represa de Guarapiranga, um dos principais reservatórios de água potável para a cidade. Em plásticos, garrafas, madeira, pneus e outros resíduos foram retirados dali, ao longo de um ano, mais de 60 toneladas. É uma das consequências da frouxidão na aplicação de leis que não permitem a ocupação humana em áreas de preservação permanente - legislação até afrouxada recentemente, quando o Conselho Nacional de Meio Ambiente passou a permitir a ocupação desde que seja legalizada, para permitir a implantação do saneamento básico em áreas ocupadas ilegalmente por mais de 1 milhão de pessoas apenas na capital de São Paulo (só que se legaliza a ocupação e não se implantam os serviços).

Essa grave questão em que se juntam água e lixo vem sendo acrescida nos últimos tempos pelo alarmante problema da saturação de reservatórios de água. Há pouco (O Estado de S. Paulo, 12/1) a Sabesp informou que os reservatórios de Atibaia, Bom Jesus dos Perdões e Piracaia provavelmente contribuiriam nos dias seguintes, se prosseguissem as chuvas intensas, para agravar o problema das enchentes na região da capital paulista, porque estavam com sua capacidade de armazenamento já esgotada, em 97,5% - o que não acontecia desde 1999. E a Agência Nacional de Águas alertava que mais da metade dos reservatórios brasileiros estava com suas comportas abertas, fora 6 das 134 represas do sistema elétrico. É mais um ângulo da delicada questão das mudanças climáticas, pois os reservatórios foram calculados para tempos em que a média de chuvas era muito menor em certos períodos.

Agora, será preciso encontrar soluções não apenas para ampliar a capacidade de armazenamento de água, como rever os padrões de construção e manutenção, idealizados para outros tempos e necessidades. Não se pode esperar que aconteçam outros casos como os de Goiás, onde pelo menos duas barragens se romperam e inundaram ampla área de produção. Mas é preciso correr contra o tempo, em todos os sentidos.


Washington Novaes é jornalista

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